INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

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Boletim - 322 - Setembro/2019





 

Coordenador chefe:

Luigi Barbieri Ferrarini

Coordenadores adjuntos:

Ana Maria Lumi Kamimura Murata, Bernardo Pinhón Bechtlufft, Daiane Ayumi Kassada, Danilo Dias

Conselho Editorial

Criminalização da LGBTQI+fobia no Brasil pós-democrático: possíveis discussões a partir da crítica criminológica

Autora: Luciana Costa Fernandes

Introdução

2019 tem sido um difícil ano, sobretudo para aquelas pessoas que militam contra e/ou são interpeladas pelas LGBTQI+fobias. A despeito do resultado da corrida eleitoral do ano que passou,(1) que levou à presidência Jair Bolsonaro,(2)  e nomeação de Damares Alves como ministra da pasta Mulher, Família e Direitos Humanos,(3) o Supremo Tribunal Federal equiparou, por maioria, a LGBTQI+fobia ao racismo (Lei 7.716/89)(4) para fins de responsabilização penal pela prática. A decisão, queimplica na previsão da criminalização das hostilidades com base em identidades de gênero e orientação sexuais que destoam da cisheteronormatividade(5) emerge no centro das tensões políticas narradas, negociando aparência de proteção normativa em um contexto de ofensivas que tem demandado cada vez menos estar mascarada – porque retrato dos autoritarismos que vivemos.

Assim, integra as pautas pela resposta penal o cenário de disparada, no Brasil, de violências contra essas minorias. O Brasil é um dos países que lidera o ranking mundial de violações de direitos humanos contra pessoas em razão de sua orientação sexual e identidade de gênero. Em 2018, foi publicado pelo extinto Ministério dos Direitos Humanos (2018) o incremento de denúncias de violações de direitos registrados pelo Disk 100:(6) embora patente a subnotificação dos casos, só naquele ano teriam havido 2.963 violações registradas. O Grupo Gay da Bahia (2018, p. 01) também mapeou a morte violenta (incluindo suicídio), no país, de 420 LGBTQI+.(7) Por último, a organização não governamental International Transgender Europe (2016, p. 13-14) denunciou a ocorrência, entre 2008 e 2016, de pelo menos 868 homicídios no Brasil contra pessoas transexuais, a maior taxa em todo o mundo.

Entre as demandas pelo reconhecimento e por contrapartidas estatais, emergem as pautas populistas criminológicas, tendenciosas, para amansar as reivindicações, já que aparelhadas pela autossuficiência que o simbolismo próprio da resposta penal carrega. Nesta investigação, a proposta é a de questionar as principais argumentações que promoveram a adesão ao projeto criminalizante, a partir dos referenciais da criminologia queer e criminologia racial, e a legitimidade democrática da solução, considerando regras fundantes em matéria constitucional e penal.

1 Funções declaradas da LGBTQI+fobia e os aportes da crítica criminológica

Parte da sustentação dos discursos que demandaram a criminalização da LGBTQI+fobia esteve centrada na opinião de serem os atuais instrumentos jurídico-normativos inexistentes ou insuficientes para a reprimenda e consequente prevenção de atentados contra essa população. Costuma-se dizer que as violações praticadas não encontravam ressonância na legislação vigente, motivo pelo qual a regra é a de restarem impunes. A certeza da improvável responsabilização, por sua vez, incentivaria novas práticas, formando-se um ciclo contra o qual caberia à resposta dura em matéria criminal romper, preferencialmente recorrendo-se ao sentido mais aflitivo da pena.

Uma primeira questão pode ser trabalhada pelo campo de entrelaçamentos entre os estudos criminológicos e a teoria queer(8) – por algumas pessoas reivindicado como criminologia queer (CARVALHO, 2018, p. 201 e ss.). O discurso cultural hegemônico quanto a sexo-gênero-sexualidade se estabelece na pretensa universalidade e racionalidade de estruturas binárias, permeado por processos de significação que reificam o masculino e o feminino.  Os modos de referência da identidade e dos afetos são capturados para que se normalize na cultura a ideologia de que homens vivam a sua masculinidade e mulheres sua feminilidade e para que as pessoas que vivenciam experiências dissentes, como LGBTQI+, vivam em condição de seres abjetos.

Sob esse marco epistemológico, as “linhas causais ou expressivas de ligação entre o sexo biológico, o gênero culturalmente construído e a ‘expressão’ ou ‘efeito’ de ambos na manifestação do desejo sexual por meio da prática sexual” (BUTLER, 2014, p. 38) são percebidas como produtoras da sociedade profundamente cissexista (KAAS, 2016) em que vivemos. Dessa forma, a LGBT+fobia pode ser situada nos arranjos que tomam a heteroscisnormatividade como organizadora política e social (RODOVALHO, 2016), impondo às pessoas que performatizam as rupturas com a ordem normativa violências que operam em diversos níveis.(9)

Pensar sobre a complexa matriz cultural a partir da qual se estrutura a LGBTQI+fobia nos leva a questionar se o mero cumprimento de uma pena aflitiva poderia, de fato, promover uma alteração dessa ordem. Em que medida o poder de punir tem potencial para transformar o domínio do cissexismo, que é base das ameaças aqui tratadas? Se os altos índices das violências se devem a estruturas anteriores, e que dizem respeito à reflexão sobre a heteronormatividade compulsória, reivindicações pela igualdade que continuam a crer no Direito Penal como capaz de romper com essa ordem são, para dizer o mínimo, ingênuas.

Uma segunda questão gira em torno da advertência de que os atentados contra a população já poderiam, em tese, ser enquadrados nos crimes da legislação penal geral e especial. Vale lembrar que a tipificação dos crimes de homicídio, injúria, lesões corporais e crimes sexuais, por exemplo, remonta ao século passado e incide nos casos mesmo sem a qualificação desses atos como da ordem do preconceito. Se, mesmo assim, não tem sido a resposta penal capaz de impedir o aumento dessas ocorrências, é possível que a real dificuldade enfrentada não esteja no campo efetivamente normativo – agora “solucionado” pelo STF –, mas sim no da aplicação prática, quando a dificuldade passa pelas estruturas também cissexistas das agências do sistema penal responsáveis pela investigação e instrução processual.(10)

Localizada na trajetória epistêmica da crítica criminológica, o debate das determinações não determinantes das violências contra essas minorias pode ser problematizado a partir da análise dos fatores de vulnerabilização (BATISTA, 2017, p. 46-51) do poder punitivo. Décadas de produção acumuladas na área já assentaram a constatação de que os processos de vitimização e criminalização operam diferencialmente e estão também relacionados às relações de poder que conformam identidade de gênero e orientação sexual.

É nessa linha que se pode supor que, além de ingênuas, as demandas pela criminalização podem ser lidas como incongruentes, porque negociam com um sistema que, enquanto historicamente imbuído pela demarcação das relações de dominação, produz violências sequenciais à população LGBTQI+, que é criminalizada e vitimizada. Pesquisas que mapeiam as condições sub-humanas em que essa população vive sua passagem pelo cárcere (CANHEO, 2017), e as violências que suporta quando recorre ao sistema para denunciar atentados (LEMOS, 2017) são exemplos disso.

A crença no aprisionamento como solução para demandas que nos convocam a fissurar diferenciações de base estrutural soa como mais do mesmo. Assim foi, guardadas as diferenças de pauta, com o feminicídio; com o racismo:(11) não há sequer uma pesquisa que revele que esses fatos têm sido coibidos pela possibilidade do cárcere. Por que achar que, agora, será diferente ?

Quanto à promessa da prevenção, há décadas se vem problematizando as chamadas “ilusões re”(12) nas produções críticas em criminologia. A história dos discursos criminológicos, observando as relações de poder constituintes da questão criminal, nos coloca diante dos problemas para se atender ao clamor por punição em nossa região. Por aqui, a história racista de legitimação e exercício do controle de corpos negros através da pena (FLAUZINA et al, 2015) e de manutenção dos privilégios da supremacia branca implicados no poder de punir (PIRES, 2018) revela que a seletividade é imanente ao sistema. A cultura punitiva que se constrói na adesão ao falacioso discurso liberal clássico da prevenção naturalizou, em verdade, o maior crime contra a humanidade contemporâneo: o genocídio do povo negro. E isso só se mantém porque a prisão se constrói como destino dos “outros” e como exitosa estratégia que silencia as estruturas de base das opressões: “Esse é o trabalho ideológico que a prisão realiza – ela nos livra da responsabilidade de nos envolver seriamente com os problemas de nossa sociedade, especialmente com aqueles produzidos pelo racismo e, cada vez mais, pelo capitalismo global”. (DAVIS, 2018, p. 16-17).

Assim, negociar o reconhecimento de direitos através do recrudescimento penal é assumir as consequências naturais do sistema prisional por excelência racista e cisheteronormativo. É admitir que se demanda uma resposta que será, necessariamente, seletiva e, portanto, reprodutora das históricas matrizes de opressão de raça, classe e sexualidade em todos os níveis de sua intervenção – da vitimização à criminalização: um sistema que nunca pôde diminuir os ataques contra os grupos minoritários e ainda autoriza as opressões contra os mesmos; e no qual são mantidos os ciclos de privilégios e vantagens históricas de que usufruem os grupos hegemônicos.

2 Ativismo judicial em tempos de pós-democracia

Um último bloco de reflexões percebe a decisão do Supremo situada em um contexto singular para o ativismo judicial. Os tensionamentos à imparcialidade do Judiciário e das bases democráticas em matéria processual têm ganhado novos contornos desde as mais recentes discussões sobre a operação Lava Jato. Em tempos duros de pós-democracia e de emergência de conservadorismos,(13) o Poder Judiciário, munido das aparências de neutralidade, se apresenta como interessante condutor do arquétipo de cena política favorável ao neoliberalismo.

Isso porque, sob o manto do discurso da aplicação igualitária da lei, permanecem enfraquecidos os debates sobre a forma como a composição histórica da agência judiciária pelas elites tem determinado que as decisões, inexoravelmente, marquem privilégios de raça, classe, gênero, sexualidade. Ainda, sobre como a dificuldade contramajoritária da atuação judiciária deveria, de uma vez por todas, determinar que a atuação desse poder se subordinasse à inércia ou ilegalidade das instâncias com representatividade. A falta do respaldo do voto popular à magistratura tem inclusive facilitado uma cada vez maior complacência no apelo ao clamor público, já que “o distanciamento em relação à população gerou em setores do Poder Judiciário uma reação que se caracteriza pela tentativa de produzir decisões judiciais que atendam à opinião pública (ou, ao menos, aos anseios externados na opinião pública pela mídia)”. (CASARA, 2018, p. 75).

Se o debate tem tônus em qualquer área das ciências jurídicas, na área criminal ganha ainda maior relevância, na qual as regras da legalidade e da intervenção mínima funcionam como bases, ao menos em teoria, inegociáveis. A percepção de que a responsabilização penal é a mais atentatória a direitos humanos informa que apenas as violações mais gravosas, e quando nenhuma outra esfera de responsabilização oferecer contrapartida suficiente, devem sujeitar alguém à possibilidade do exercício do poder punitivo – intervenção mínima.

Esse também é o motivo de a opção pela criminalização ter que passar pelo filtro do legislativo, cuja representatividade refletiria o mínimo de participação na decisão sobre quais seriam esses casos. Inserida como cláusula pétrea no artigo 5°, inciso XXXIX da CF, a regra da legalidade funciona como um aparelhamento democrático, já que institui que as leis penais devem emanar dos órgãos legislativos do Estado (BATISTA, 2017, p. 204).

A experiência, cada vez mais, é a de uma total prescindibilidade das regras que dizem respeito à repartição de poderes e soberania popular em favor das demandas por mais punição e por mais atuação judicial. Quando se autoriza que o STF inclua uma elementar criminalizadora em uma lei – já que não há controvérsia quanto ao sentido de algum dos termos da norma –,(14) inevitavelmente se está alterando o jogo republicano, atribuindo capacidade legislativa a órgão não eleito. Abre-se uma nova porta para que uma elite sem representatividade, e que já se revelou alinhada aos arranjos políticos e da razão neoliberal, assuma protagonismo no processo de delineamentos da pós-democracia brasileira.

Conclusão

O contexto atual para a promoção de ação política na defesa de pessoas LGBTQI+ é sabidamente hostil. Embora as experiências de lutas e de resistências historicamente nos revelem tratar-se de uma discussão para muito além do que o Direito pode cindir, importa refletir desde esse campo. Neste artigo, não se desconsidera a necessidade de reconhecimento das demandas identitárias – inclusive, por responsabilizações. O que se problematiza é o horizonte de prisionização como resposta preferencial para opressões estruturais como as que se debate, imaginando ser a estratégia da criminalização, além de ingênua e incongruente, um mecanismo de ofuscamento de possíveis pautas de transformações profundas e duradouras.

O horizonte da contrapartida penal não responde à complexidade estrutural das matrizes de opressão cisheteronormativas, porque não atinge os valores sociais e culturais a que se relacionam nem na sua superfície. Além disso, a promessa da prevenção em termos liberais clássicos é falaciosa. Primeiro, porque antes da decisão comentada, os instrumentos penais de responsabilização plenamente aplicáveis já demonstravam a sua insuficiência. Segundo, porque as agências do sistema penal têm cumprido historicamente a função de reproduzir as opressões estruturais da nossa sociedade – entre as quais incluem-se as de gênero e sexualidade, imbricadas sobretudo ao racismo. Admitir ser a via da criminalização forma do controle seletivo preferencial de corpos negros e de vitimização da população LGBTQI+ e mesmo assim demandar punição é negociar proteção a partir da violação de direitos de outros e, ainda, das mesmas minorias.

Por fim, a opção pela criminalização através da via judicial, considerando as regras da legalidade, da intervenção mínima e da separação de poderes, é uma afronta constitucional. Mas tem o condão de revelar o tônus do estado pós-democrático da atual conjuntura brasileira, que parece cada vez mais organizar em segundo plano os espaços políticos com representatividade e, em primeiro, um ativismo do judiciário violador de regras de soberania popular básicas.

Nessa toada, deve integrar a militância pelo incremento dos – ainda limitados – potenciais emancipatórios dos direitos humanos discutir até que ponto devemos nos bastar com aparência de neutralidade na aplicação da norma penal que não reflete sobre os impactos da criminalização. Este artigo caminha nesse sentido: de perceber que a crítica já assentada ao sistema penal deve, de uma vez por todas, interpelar – porque fundantes das reivindicações de base dos direitos das minorias – formas concretas de promoção de ação política que prescindam dos remédios penais.

Referências

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Batista, Nilo et al. Direito penal brasileiro: teoria geral do direito penal. v. 1 Rio de Janeiro, RJ: Revan, 2017.

Batista; Vera Malaguti. Adeus às ilusões “re”. In: Coimbra C.; Ayres, L. S. M.; Nascimento, M. L. (orgs.). Pivetes:Encontros entre a psicologia e o judiciário.  Curitiba: Juruá , 2008. p. 195-199 .

BRASIL. Ministério dos Direitos Humanos. Violência LGBTFóbicas no Brasil: dados da violência. Elaboração de Marcos Vinícius Moura Silva. Brasília: 2018. Disponível em: .

Butler, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução: Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2014.

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Casara, Rubens. Precisamos falar da direita jurídica. In: Solano, Esther et al (ed.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2018.

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Notas

(1)  Imbuída pelo clamor contra as “ideologias de gênero” e dos falaciosos “kits gays”.

(2)  Presidente que já se autodeclarou, anos atrás, homofóbico e que continua assim se portando nos comunicados oficiais, como revelam os recentes atentados a  Jean Wyllys e Glenn Greenwald (PUTTI, 2019).

(3)  Pastora que ficou conhecida após a advertência de que “menino veste azul e menina veste rosa”. Recentemente, foi a público vídeo seu em que adverte a sociedade sobre os perigos de uma “princesa” de filme infantil: ““Sabe por que ela [Elsa] termina sozinha em um castelo de gelo? Porque é lésbica! O cão está muito bem articulado e nós estamos alienados”. Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=KoRT5cU57cQ >. Acesso em 03/07/2019.

(4)  No bojo da ADO 26 e MI4733, apresentadas ao STF em 2012 e 2013, com julgamento iniciado em fevereiro e concluído em junho de 2019. Foram 8 votos favoráveis à equiparação da LGBTQI+fobia ao racismo e 3 divergentes. Os ministros contrários, Dias Toffoli, Lewandowski e Marco Aurélio, preferiram transferir a responsabilidade da criminalização para o Congresso.

(5)  Diálogo com a definição de LGBTQI+fobia de Diego Lemos e Thayara Branco como “hostilidade geral, psicológica e social contra aqueles(as) que, supostamente, sentem desejo ou têm práticas sexuais com indivíduos do mesmo sexo (práticas homoeróticas). Atuando como forma específica do sexismo, a LGBTfobia rejeita, igualmente, todos(as) aqueles(as) que não se conformam com o papel de gênero predeterminado para o seu sexo biológico. Trata-se de uma construção ideológica que consiste na permanente promoção de uma forma de sexualidade (hétero) em detrimento de outra (homo) e uma forma de identidade de gênero (cis) em detrimento de outra (trans), organizando uma hierarquização das sexualidades e identidades” (LEMOS; BRANCO; 2015).

(6)  Principal centro nacional de recebimentos de denúncias de violação de direitos humanos contra a população LGBTQI+.

(7)  Em 2017 haviam sido 445 vítimas e, em 2016, 343. Produzido há 39 anos ininterruptos, o relatório identificou, no ano 2000, 130 mortes; em 2010, haviam sido 260 (GGB, 2018, p. 01).

(8)  Teresa de Lauretis foi a primeira a usar a expressão queer theory enquanto hipótese de trabalho. O termo queer remetia a um xingamento e é mantido em sua literalidade para destacar a intenção da sexualidade não assimilada (MISKOLCI, 2009).

(9)  Salo de Carvalho destaca os níveis interpessoal, institucional e simbólico (CARVALHO, 2018, p. 218).

(10)  De acordo o último relatório do GGB “policiais, delegados e juízes manifestam sua homotransfobia ignorando tais crimes, muitas vezes negando sem justificativa plausível sua conotação homofóbica” (2018, p. 18).

(11)  As Leis 7.716/89 e 13.104/2015 trouxeram as opressões de raça e contra as mulheres para fins de tutela penal.

(12)  Para Vera Malaguti: “(...) a partir dos 70, a criminologia crítica constitui-se como um saber que deslegitima o sistema penal como solução à conflitividade social. A partir daquelas leituras já não se po!dia crer nas ilusões “re”: reeducação, ressocialização, reintegração. Pelo contrário, a clientela do sistema penal foi sempre a dos dessocializados, desintegrados, desclassificados. A prisão surge como um grande fracasso nos seus objetivos explícitos, mas sempre um sucesso para diferenciar, arrumar e controlar as ilegalidades.” (BATISTA, 2008, pp.195-196).

(13)  Segundo Luciana Ballestrin, “A conjuntura pós-democrática atual pode ser caracterizada a partir de uma série de eventos que sugerem a escalada global de a)um recuo democrático no seu sentido hegemônico e formal, possibilitado por dentro das próprias instituições democráticas; b) a ascensão de discursos abertamente autoritários, anti-democráticos e anti-humanistas, com apelo e adesão popular/populista; c) a crescente colonização da esfera econômica internacional sobre a vida política nacional; d) o espraiamento da razão neoliberal para todas as esferas da vida pessoal e coletiva, inclusive política; e)o esvaziamento da política e da democracia” (BALLESTRIN, 2017, p. 14).

(14)  A ausência do preconceito por identidade de gênero e orientação sexual não está albergada no texto do art. 1º, da Lei 7.716/89: “Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.”

Luciana Costa Fernandes
Doutoranda em Direito pela PUC-Rio. Mestra em Direito Penal pela UERJ. Professora substituta de Criminologia, Direito Penal e Processo Penal da UFRJ. Membra associada da “Elas Existem - mulheres encarceradas”. Advogada.
ORCID: 0000-0003-1364-7420
lucianafernandesppa@gmail.com
Recebido em: 07.07.2019
Aprovado em: 06.08.2019
> Versão final: 13.08.2019



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