INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

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Boletim - 298 - Setembro/2017





 

Coordenador chefe:

Fernando Gardinali Caetano Dias

Coordenadores adjuntos:

Daniel Paulo Fontana Bragagnollo, Danilo Dias Ticami e Roberto Portugal de Biazi

Conselho Editorial

O sistema carcerário brasileiro entre 1992 e 2017

Autora: Paula Bajer Fernandes Martins da Costa

O Instituto Brasileiro de Ciências Criminais foi criado em 1992, mesmo ano em que aconteceu o massacre do Carandiru, presídio paulista que não existe mais (sobre o massacre: https://www.massacrecarandiru.org.br).

Depois de 25 anos, o massacre ainda não recebeu resposta jurídica. Não há, na causa penal, decisão de mérito transitada em julgado. O tramitar indefinido do processo correspondente gera insegurança e instabilidade no sistema de responsabilidades, pois permanece, para a sociedade, a dúvida sobre os limites dos agentes estatais no interior das prisões.

Passados 25 anos, o IBCCRIM estabeleceu-se na comunidade jurídica não só a partir de estudos e reflexões, mas posicionando-se, cada vez mais, pelo respeito concreto aos direitos e garantias individuais. 

A sociedade também encontrou novas maneiras de proteção e defesa da vida e da liberdade. Foram criados mecanismos de controle e fiscalização dos locais de detenção.

O Brasil aderiu ao Protocolo Facultativo à Convenção Contra Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes da Organização das Nações Unidas em 2007.

Em 2013, foi editada a Lei 12. 847/14, que instituiu o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura. A lei criou o Comitê Nacional de Combate à Tortura e o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura. O último, constituído de 11 peritos, tem, em síntese, dever e poder de visitar estabelecimentos prisionais, relatando situações de desrespeito à dignidade e emitindo recomendações. 

A lei estabelece que os Estados poderão criar seus Mecanismos e é importantíssimo que sejam criados, pois, independentemente de o Mecanismo Nacional não dar conta de visitar, rotineiramente, todos os cárceres, devem ser intensificadas e multiplicadas as maneiras de fiscalização por instituições independentes.

As visitas e o permanente controle constatam e previnem torturas e violações à dignidade. A vigilância incentiva práticas administrativas positivas e faz com que a comunicação entre as pessoas privadas de liberdade e a comunidade crie condições para vida digna. Na medida em que o sistema não é fiscalizado e se fecha, a violência aumenta e as condições de sobrevivência deterioram-se a ponto de a prisão não ser, de modo algum, habitável.

Há medidas da Corte Interamericana de Direitos Humanos que obrigam o Brasil a assumir providências para proteger a vida e a integridade de pessoas privadas de liberdade no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, no Maranhão , assim como no Complexo do Curado, em Pernambuco. Em 2017, a Corte Interamericana de Direitos Humanos emitiu recomendações e fez 52 indagações ao Brasil relacionadas ao sistema carcerário, tendo unido, para tanto, quatro episódios concretos: Complexo de Pedrinhas, no Maranhão, complexo do Curado, em Pernambuco, Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, no Rio de Janeiro, e Unidade de Internação Socioeducativa, no Espírito Santo.

Não obstante tentativas de redução da violência nas prisões, o ano de 2017 começou com conflitos de intensidade máxima. Em presídios do Amazonas, Rio Grande do Norte e Roraima, pessoas em situação de encarceramento desumano chegaram à barbárie. Meios de divulgação relataram amplamente esses conflitos, valendo citar, como referência, análises do Nexo Jornal (www.nexojornal.com.br).

Não importa, aqui, narrar quem começou os conflitos, ou se a participação de facções criminosas atenua a responsabilidade estatal.  O essencial é a conclusão de que o encarceramento em condições degradantes de superlotação só pode gerar brutalidade e crueldade.

Comitês e Mecanismos de prevenção e combate à tortura devem ser criados em todos os estados da federação. No Estado de São Paulo há mobilização voltada à criação do Comitê e do Mecanismo. Representantes de diversas entidades da sociedade civil, entre elas o IBCCRIM, assim como representantes de instituições públicas, têm unido esforços para transmitir a todos a imprescindibilidade de um sistema estadual de prevenção e combate à tortura.

Cabe a São Paulo estabelecer o Comitê e o Mecanismo, fixando, desde logo, disposição do Estado de abrir seus presídios à fiscalização independente e evidenciando trabalho constante para prevenir situações que podem conduzir a violência igual à de 25 anos atrás, ou pior, pois a situação prisional e seus conflitos tornaram-se mais complexos.

Paula Bajer Fernandes Martins da Costa
2ª Secretária do IBCCRIM na gestão 2007-2008.
Doutora e mestra em Direito Processual Penal pela Universidade de São Paulo.
Procuradora Regional da República na 3ª Região.



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