INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

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Boletim - 133 - Dezembro / 2003





 

Coordenador chefe:

Celso Eduardo Faria Coracini

Coordenadores adjuntos:

Carlos Alberto Pires Mendes, Fernanda Emy Matsuda, Fernanda Velloso Teixeira e Luis Fernando

Conselho Editorial

Liberdade de informação. Mídia e proteção da vida privada.

Autor: Cezar Peluso

STF
Med. Cautelar
em MS nº 24.706-1/DF
Relator: Min. Cezar Peluso
j. em 10.11.03.

Decisão

1. É grave e delicada a questão posta no requerimento de liminar, porque, com envolver modalidade de colisão de princípios constitucionais, implicará o reconhecimento da limitação do âmbito de um deles, ponderada no exame das circunstâncias do caso concreto, qualquer que seja o teor da resposta, que há de ser pronta.

O que pretendem os impetrantes nada tem de irrazoável, pois, não se furtando ao dever de comparecimento à audiência da CPI, nem à publicidade do ato, querem apenas resguardar suas imagens a eventual abuso de exposição na mídia. Este é, deveras, risco perceptível a direito que tem igual assento constitucional. Ao propósito, invocando-se René Ariel Dotti (Proteção da Vida Privada e Liberdade de Informação, p. 202) e Silma Mendes Berti (Direito à Própria Imagem, p. 65), adverte-se sem exagero: "As acusações formais acarretam geralmente uma presunção de culpa oriunda do meio social que neutraliza a presunção de inocência. Esta, embora constitua um direito (o direito de ser presumido inocente) não tem força bastante para se impor à comunidade a qual, por força da liberdade de expressão do pensamento, exerce também um direito: o direito de julgar'. É freqüente assistirmos pela televisão à exibição, pela polícia, de pessoas detidas por envolvimento em fatos criminosos, ainda na fase de apuração de autoria, e que se vêem precocemente submetidas a verdadeiro julgamento público. Essas pessoas, meros suspeitos, podem não ser culpadas e conseguir a prova de sua inocência. Mas a divulgação de rostos pela imprensa, a sugerir que se tratam de criminosos, é fato irreparável, que lhes imprime uma 'marca indelével de desonestidade e até de periculosidade que dificilmente será desfeita. E deixam por certo um dano de difícil reparação" (Estela Cristina Bonjardim, O Acusado, Sua Imagem e a Mídia, São Paulo: Max Limonad, 2002, pp. 113-114).

A restrição à exposição abusiva da imagem, enquanto possibilidade que não pode ser descartada a priori e contra a qual o único remédio é preventivo, em nada sacrifica o interesse público, figurado no livre trabalho de apuração da CPI e na publicidade dos atos processuais, que os impetrantes, aliás, não tencionam impedir, de modo que não faz agravo nenhum ao Poder Legislativo no exercício legítimo de suas funções. Nem custa observar a respeito que o próprio Regimento Interno da Câmara dos Deputados submete à discrição do Presidente das Comissões e, portanto, à consideração específica das circunstâncias históricas, a autorização prévia para irradiação ou gravação (arts. 57, XIX, e 78), as quais não constituem, pois, adjetivos imanentes do procedimento investigatório, nem da efetividade e, tampouco, da publicidade de seus atos.

Isso quer dizer, ainda, que o particular não tem direito subjetivo de gravar nem fotografar a inquirição de testemunhas. É conhecida a manifestação do Chief Justice Earl Warren, quando, em abril de 1965, em hipótese que envolvia a presença da televisão nos julgamentos: "televising criminal trials 'turns the clock backwards and converts the courtroom into a public spetacle... The press is entitled to be present at trials not because it is the press, but because it is a part of the public" (Bernard Schwartz , Constitutional Issues: Freedom of The Press, NY: Facts on File, 1992, p. 29).

Tal presença pode, sem degradação alguma da liberdade de informação e da imprensa, ser até vetada, quando dela possa advir escândalo, inconveniente grave, ou perturbação da ordem (art. 792 do Código de Processo Penal, cc. art. 6º da Lei nº 1.579, de 18 de março de 1952), como, aliás, o autoriza a Constituição (art. 93, IX, in fine), o que significa que tal presença sequer substancia direito superior às exigências internas do processo, como garantias de preservação de outros direitos, entre os quais o direito à honra e à imagem de pessoas, sobretudo se ainda tidas por inocentes ex vi Constitutionis. Tal raciocínio agrava-se na hipótese em que a pessoa deva ser ouvida como testemunha, a qual não pode ser exposta a risco de dano indenizável, mas irreparável.

2. Do exposto, concedo a liminar, para proibir o acesso de câmeras de televisão, gravadores e máquinas fotográficas, de propriedade de particulares ou concessionárias, nas dependências do recinto em que os ora impetrantes serão ouvidos pelos ilustres membros da CPI e enquanto lá deponham. Comunique-se incontinenti à autoridade apontada como coatora.

Publique-se. Int.

Cezar Peluso



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