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Boletim - 28 - Abril / 1995


Editorial

A presunção de inocência e o direito de recorrer em liberdade

Olavo Berriel Soares

"Processual penal. Habeas-corpus. Homicídio (acidente de trânsito). Réu primário e de bons antecedentes, que compareceu a todos os atos processuais para os quais foi convocado. Sentença de pronúncia que permitiu ficasse o paciente em liberdade. Inexistência de fato novo dou motivação da sentença condenatória, demonstrando a necessidade da custódia ante tempus. Recurso ordinário conhecido e provido."

(STJ, RHC nº 4.085-8, 6º Turma, rel. designado Min. Adhemar Maciel, j. 15.12.94, m.v. – vencidos os Mins. Pedro Acioli, Rel. originário e Vicente Leal, DJU, 6.3.95, p. 4.392).

"Constitucional e penal, Habeas –corpus. Paciente que se defendeu solto durante todo o curso do processo. Absolvição no primeiro grau e condenação em segundo. Regime prisional, o semi-aberto. Acórdão que não demonstra a imperiosidade da prisão ante tempus. Ordem concedida para que o paciente permaneça em liberdade até que sejam julgados os recursos excepcionais.

"I – O paciente, que já não tinha bons antecedentes, foi processado por lesões corporais graves (atirou um copo na cabeça da vítima). Respondeu a todo o processo em liberdade. Foi absolvido em primeiro grau e, em segundo, condenado a 2 anos e 6 meses de reclusão. Regime prisional, o semi –aberto. Pediu fiança, não a logrando.

"II – O paciente, é certo, não faz jus à b fiança. Mas, em contraposição, não pode ser recolhido à prisão comum por duas razões antes do trânsito em julgado da condenação; a) o acórdão não justificou a imperiosidade de seu recolhimento ante tempus. Logo, em obediência aos princípios da presunção de inocência e da motivação dos atos judiciais, de base constitucional, deve continuar em liberdade até o trânsito em julgado da decisão; b) ficar na cadeia pública implicaria gravame para quem foi condenado a regime semi-aberto.

"III – Ordem concedida."

(STJ – HC nº 2.806, 6º Turma, Rel. designado Min. Adhemar Maciel j. 18.10.94, m.v., - vencido os Mins. Pedro Acioli, Rel. originário e Anselmo Santiago, DJU 6.3.95, p. 4.387).

Esses dois acórdãos do Superior Tribunal de Justiça dizem respeito à questão da aplicação do princípio constitucional do estado de inocência (art. 5º, I, LVII da Carta Magna) em relação ao direito de recorrer em liberdade. Após o advento da Constituição de 1988, a doutrina e a jurisprudência amplamente dominantes vêm reconhecendo que as normas processuais penais que estabelecem limitações ao direito de recorrer em liberdade (notadamente o art. 594 do CPP e o art. 27, § 2º da Lei nº 8.038/90, entre outras) for a recepcionadas de maneira integral pela nova Carta. Segundo tal entendimento, as hipóteses de prisão ante tempus de nosso ordenamento seriam medidas de caráter cautelar, cuja necessidade foi determinada pelo legislador, adequando-se assim aos elementos do princípio do estado de inocência (cautelaridade e necessidade). Tal posição foi cristalizada pela Súmula 9 do STJ, segundo a qual "a exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência".

Há, no entanto, entendimentos minoritários no sentido da revogação do art. 594 do CPP pela nova Constituição (RT 645/296, 669/360. 668/325). E há uma posição intermediária, segundo a qual só é permitida a negação ao direito de recorrer em liberdade se houver fundamentação explícita na sentença acerca da necessidade da prisão ante tempus, não mais se admitindo que a necessidade de tal medida seja fixada aprisiristicamente pelo legislador. É essa a posição adotada pelos julgados transcritos acima. Note-se que tal posicionamento vem sendo adotado somente pela 6º Turma do STJ e, mesmo assim, apenas alguns dos Ministros daquela Turma esposam esse entendimento minoritário (Adhemar Maciel, Luiz Vicente Cernicchiaro, Anselmo Santiago).

Olavo Berriel Soares



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