Antonio Carlos Franco
Álvaro Busana, Antonio Carlos Franco, Ana Sofia Schmidt de Oliveira, David Azevedo, Helios A.
Alguns a tiveram pela rainha das provas , outros por fenômeno contrário à natureza não poucos a interpretaram como argumento de honradez : a confissão judicial foi sempre tema de que se ocuparam os mais graves autores, que a definiram como "declaração da própria responsabilidade "
Confessar alguém um fato o mesmo é que admitir-lhe a autoria. A prevenção, por isso, com que muitos a recebem já entrou em provérbio: se disseres a verdade, irás à força.
Mas, ainda que, geralmente falando, se deva reservar "a confissão à Justiça do Altíssimo, e o silêncio à dos homens", como alvitrava Jacques Isorni ; a despeito de, confessando a autoria do fato, fechar o acusado sobre si a porta do cárcere, há casos em que ela se mostra de rigor; outros, em que será ato de razão esclarecida.
Assim, é forçoso que admita a autoria de certo fato aquele que o pretenda justificar nas barras do pretório. Primeiro que alegue de sua justiça em pontos de legítima defesa, haverá o réu de admitir, com efeito, que repelira com violência o agressor. Sua confissão, em tal caso é pressuposto lógico e jurídico da afirmação de que obrara sob a égide daquela excludente de injuridicidade.
Situações existem, no entanto, que suposto não se ajustem ao rol das descriminantes, toleram (se é o não aconselham) confesse o argüido a autoria do fato que lhe é imputado. São aquelas em que a sua negativa quanto ao fato representaria, pelo estado da prova, um sesquipedal insulto à inteligência do inquisidor e de qualquer pessoa de suficiente consideração. Deveras, que mais atentatório do siso comum que isso de insistir o réu em negar, perante o magistrado, aquele mesmo fato cuja autoria admitira, sem ambages, na quadra do inquérito?
Não vale contra esta conseqüência a objeção do leitor perspicaz, de que confissões extrajudiciais padecem da eiva da suspeição, visto se presumem obtidas mediante violência: a muitos infelizes, em boa verdade, extraíram-se confissões juntamente com suas fibras musculares! Não há negá-lo, e as crônicas forenses demonstram-no além de toda a dúvida .
É outra, no entanto, a hipótese que figuramos aqui: a do agente que, sobre haver admitido por declarações no inquérito a prática do delito - furto, por exemplo -, for a preso em flagrante, reconhecido pessoalmente por testemunhas, e em seu poder apreendidas as coisas que subtraíra à vítima. Em tal caso, seria de indivíduo sensato aventurar-se à negativa da autoria do fato criminosos, recalcitrando-se à força da evidência? Ficamos que não. Uma coisa é ser cego, outra negar a existência da luz! Aí pediria a razão que, em seu interrogatório, confessasse o réu, sem salvas nem rodeios, a imputação. Com o quê, do mesmo passo que se pouparia ao arronado e baldio empenho de pelejar contra a realidade da prova dos autora, faria jus ao benefício do art. 65, n III, letra d, do Código Penal, que inscreve a confissão entre as circunstâncias atenuantes da pena .
Por último - e é coisa muito digna de reparo -, trai algo de nobre e louvável o ato de quem, havendo percorrido a vereda da iniqüidade, lá um dia reconheça as faltas que cometeu e proteste emendar-se.
Matéria é esta das mais delicadas, e parece mesmo andar às testilhas com o sagrado princípio da amplitude do direito de defesa. Nada mais inexato, porém; antes, conforma-se às inteiras com aquele venerando aforismo jurídico: para ruim defesa, melhor é nenhuma.
"A confissão sempre foi reputada prova excelente - regina probationum -, pois que é contrário à natureza alguém afirmar contra si fato que não seja verdadeiro" (Mário Guimarães, O Juiz e a Função Jurisdicional, 1958, pág. 309). R. Garraud, pelo mesmo feitio: "Os antigos consideravam a confissão como a prova por excelência, probatio probatíssima, a rainha das provas, a única que podia num processo criminal assegurar a consciência do juiz e permitir-lhe, sem escrúpulo como sem remorso, pronunciar o castigo capital.'
(Compêndio de Direito Criminal, 1915, vol. NII, pág. 207; trad. A.T. de Menezes);
A confissão afirmam alguns que se acha em hostilidade aos ditames da natureza porque esta impõe silêncio ao culpado (c.f. Mittermayer, Tratado da Prova em Matéria Criminal, 187, t. II, pág. 6º; trad. Alberto Antononio Soares);
"Nenhum homem se deve envergonhar de haver errado; estranhar erros num homem é não querer conhecer que é homem. A nossa maior desgraça não é cair em erros, e não os poder conhecer, ou não querer emendá-los" (Bluteau, Vocabulário, 1713, t. III pág. 192);
CF. Bento de Faria, Código de Processo Penal, 1960, vol. I, pág. 290;
Apud Eliasar Rosa, Dicionário de Conceitos para o Advogado, 1974 pág. 63;
Por não estirar muito este escrito, citamos apenas o Caso dos Irmãos Naves (Sebastião e Joaquim), que passa pelo maior erro judiciário do País. Acusados, em 1937,de latrocínio e metidos a tormentos, ""confessaram" a autoria do crime, por que os condenou o Tribunal de Justiça de Minas Gerais à pena de 25 anos e 6 meses de reclusão. Eis senão quando reaparece (em 1952), são e salvo, Benedito Pereira Caetano, a pseudovítima. Acerca do assunto, que foi transportado também à tela do cinema, há copiosa literatura: Pedro Paulo Filho. Grandes advogados, Grandes Julgamentos, 1989, págs. 79 e 85; João Alamy filho, O Maior Erro Judiciário do Direito Brasileiro, 1965; Leib Soibelman, Enciclopédia do Advogado, 1981 pág. 62; etc.;
O preceito da lei diz com a doutrina de nossos maiores: "Quem se acusa a si mesmo escusa acusador, e faz leve o seu delito" (Manuel Bernardes, Nova Floresta, 17II, t.III, pág. 259); "A confissão da culpa costuma fazer menor a pena" (Matias Aires, Reflexões sobre a Vaidade dos Homens, 1752, prólogo); "A confissão é atenuante de culpa" (Júlio de Castilho, Os Dois Plínios, 1906, pág. 3621).
Carlos Biassoti
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