INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

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Boletim - 253 - Dezembro/2013





 

Coordenador chefe:

Rogério Fernando Taffarello

Coordenadores adjuntos:

Cecília de Souza Santos, José Carlos Abissamra Filho e Matheus Silveira Pupo.

Conselho Editorial

Editorial

Independência judicial sob ataque

Membros da Associação dos Juízes para a Democracia de Honduras estiveram, no dia 28 de outubro, no último período de sessões (n. 149) da Comissão Interamericana de Direitos Humanos para noticiar diversas violações à independência judicial naquele país.

Entre os gravíssimos fatos por eles narrados estava a escolha arbitrária e nomeação, feitas pela cúpula do seu Poder Judiciário, de magistrados para cargos específicos, por exemplo, para a relevantíssima tarefa de correicionar o trabalho das Polícias Militares.

Que isso esteja ocorrendo num país no qual recentemente houve um golpe de estado, infelizmente, não é de espantar: a história mostra que o ataque à independência judicial é uma das primeiras medidas tomadas pelos estados de exceção. Foi assim, por exemplo, no Chile de Pinochet, com o seu Decreto Lei n. 1, de 1973, e, também, no Brasil de 1964, que, no Ato Institucional n. 1, suspendeu por 6 meses as garantias da estabilidade e da vitaliciedade dos funcionários públicos, abrindo a possibilidade de demissão ou aposentadoria sumárias (art. 7º, §1º), e no Ato Institucional n. 2, foi direto ao ponto ao suspender “as garantias constitucionais ou legais de vitaliciedade, inamovibilidade e estabilidade” (art. 14), então asseguradas aos juízes pelo art. 95, II, da CF de 1946.

O que espanta é ver, no ano em que comemoramos os 25 anos da Constituição Cidadã, inúmeras medidas de ataque à independência judicial – e, portanto, aos próprios direitos e garantias assegurados pela Carta de 88 – sendo levadas a cabo pelos poderes constituídos de um país que se pretende democrático.

O último boletim da Associação de Juízes para a Democracia (n. 60, p. 11) – do Brasil, não de Honduras – relata a triste notícia de que, no Estado de São Paulo, um juiz foi afastado arbitrariamente de sua atuação no âmbito criminal por ter posições garantistas.

Também neste ano, algo ainda mais grave sucedeu em terras bandeirantes: entrou em vigor a Lei Complementar n. 1.208/13, que institucionalizou, em todo o Estado, o juiz sem a garantia constitucional da inamovibilidade; o juiz que, por não ser natural, poderia facilmente ser chamado de artificial.

Segundo referida norma, que já tem sido colocada em prática pela Corte paulista, um órgão da sua Cúpula, composto por 7 desembargadores, terá o poder de designar juízes para atuarem nos departamentos estaduais de inquéritos policiais e de execuções criminais a serem criados. Da mesma forma, “por motivo de relevante interesse público” (algo de tamanha porosidade que não reclama maiores explicações), as designações poderão ser cessadas pelo mesmo órgão (art. 5º, §2º, Resolução 615/2013, do TJSP).

No que diz respeito à independência para decidir segundo a sua consciência e a Constituição Federal, portanto, em muito pouco se diferem as garantias que terão os juízes artificiais de São Paulo daquelas que têm os de Honduras ou os que judicaram durante a nossa Ditadura Militar: em tese, é inegável que todos eles, de forma mais drástica (com a cassação) ou “amena” (com a cessação de designação), podem sofrer todo o tipo de influência e intervenção, pelos mais variados motivos, em suas decisões.

Em tempos nos quais a sociedade civil, que vem ocupando as ruas desde junho de forma massiva na busca pelos seus direitos, tem sido criminalizada pela atuação brutal das Polícias Militar e Civil, saber que no mais populoso Estado do país os juízes responsáveis pela porta de entrada e pela porta de saída do sistema de justiça criminal não terão garantida a sua liberdade para decidir é algo que preocupa em demasia o IBCCRIM.

Daí o assunto, já abordado parcialmente no nosso Editorial de março de 2013 (boletim n. 244 - As agruras da execução criminal no Brasil: solução por via inconstitucional?), ser aqui mais uma vez enfatizado.

Daí o incondicional apoio do IBCCRIM ao Ato Pela Independência Judicial, ocorrido na Faculdade de Direito da Univeridade de São Paulo no último dia 26 de Novembro, no qual nossa sociedade firmou posição em prol dessa garantia funcional dos magistrados que toca de forma direta, ainda que potencialmente, o direito de todos os cidadãos.

Nesse contexto, conforta saber que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar recentemente a ADI 4.414 (Rel. Min. Luiz Fux, j. 31.05.2012, DJe 14.06.2013), reafirmou, recentemente, seu compromisso com o princípio do juiz natural, corrigindo Lei do Estado de Alagoas com defeitos semelhantes aos aqui noticiados.

Forte na crença de que, fundado na dignidade da pessoa humana (art. 5º, III, CF), nosso país há de assegurar aos seus juízes a independência necessária para proteger os indivíduos do arbítrio estatal, espera o IBCCRIM que nossos Poderes Constituídos zelem pela Constituição Federal, não só declarando a inconstitucionalidade também de leis como a paulista, como implantando definitivamente critérios objetivos e apriorísticos para a definição do provimento de todos os cargos na magistratura.



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