INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

     OK
alterar meus dados         
ASSOCIE-SE


Boletim - 202 - Setembro / 2009





 

Coordenador chefe:

André Pires de Andrade Kehdi

Coordenadores adjuntos:

Cecília Tripodi, Eduardo Augusto Paglione e Renato Stanziola Vieira

Conselho Editorial

Editorial

EDITORIAL – Imprensa e censura prévia judicial

A censura judicial não é melhor nem pior que a censura exercida nos regimes políticos autoritá­rios por agentes do Executivo. Não há “boas intenções” capazes de justificar a censura prévia. O juiz censor ou o policial censor ou o militar censor são essencialmente iguais e perniciosos.

O despacho que impediu o jornal O Estado de S. Paulo de publicar informações sobre a investigação da Polícia Federal a respeito de suposta atividade ilícita do filho do atual presidente do Senado, José Sarney, é mais um episódio de truculência que ofende o regime democrático.

Não se trata de caso isolado: a Associação Nacional de Jornais (ANJ) registra pelo menos 16 decisões judiciais semelhantes nos últimos tempos. E a existência ou não de ligação familiar entre o magistrado e a família Sarney, no caso concreto, não é o ponto mais importante da controvérsia.

A Constituição é clara ao estabelecer que a liberdade de expressão (manifestação do pensamento, criação artística e informação jornalística) não sofrerá qualquer tipo de restrição, inclusive de ordem legislativa. É clara quando afirma ser livre a atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

Nesse contexto, o conflito entre direitos da personalidade e liberdade de imprensa, absolutamente comum em qualquer país democraticamente organizado, deve ser solucionado a posteriori – cada um responde, no âmbito criminal ou civil, pelos abusos que cometer.

Não foi por outro motivo que, recentemente, o Supremo Tribunal Federal suspendeu a vigência da Lei de Imprensa, editada durante o regime militar. Mas, como se pode observar por acontecimentos cada vez mais corriqueiros, a legislação revogada, do ponto de vista objetivo, oferecia menos risco à plenitude da liberdade de imprensa do que o Código Civil, editado em 2002.

Com efeito, veículos de comunicação social são capazes sim de efetuar prejulgamentos, de ferir a honra, a intimidade e a vida privada de pessoas submetidas a investigações criminais. Mas a solução para este problema não está no controle prévio do que pode ou não ser publicado por jornais ou emissoras de rádio e TV.

A Constituição assegura o direito de resposta e a reparação do dano moral ou material decorrente da violação dos direitos da personalidade. A legislação penal prevê a punição dos crimes contra a honra e da violação de sigilo legalmente estabelecido. O que se deve exigir, portanto, é a resposta eficaz do Poder Judiciário para abusos efetivamente cometidos, e não esta inversão de valores praticada por juízes e tribunais.

No Brasil, por exemplo, autoridades responsáveis por investigações costumam “vazar” informações protegidas pelo sigilo, mas, invariavelmente, permanecem impunes... É neste aspecto que reside a fragilidade do equilíbrio constitucional. Por outro lado, o próprio sigilo pode existir, em tese, para o auxílio de malfeitores quando deveria prevalecer a transparência e o interesse público.

Do ponto de vista político, qualquer ato de censura prévia – como é o caso de proibição de notícias sobre os rumos de determinada investigação – formam um manto de suspeita que compromete a própria imagem do Poder Judiciário. Sobretudo quando é adotado para proteger a esfera de interesses de homens públicos.

Não estamos só diante de um direito do veículo de comunicação social de exercer livremente seu papel. A população tem o direito de ser informada sobre os atos dos seus governantes ou familiares e sobre a atuação das autoridades responsáveis pela investigação. A população tem o direito de ser informada sobre o eventual delito atribuído a uma “celebridade” e sobre a lisura da investigação contra ela instaurada. Faz parte da regra do jogo.

A informação jornalística tem caráter dinâmico. Não pode esperar pelo trânsito em julgado de decisões judiciais. Os erros da imprensa praticados contra inocentes não justificam o abuso de poder que caracteriza a censura prévia.

Uma frase de Thomas Jefferson sintetiza com precisão as virtudes e os defeitos da imprensa: “Se me fosse dado decidir se devemos ter um governo sem jornais, ou jornais sem um governo, não hesitaria um momento em preferir a última”.



IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - Rua Onze de Agosto, 52 - 2º Andar - Centro - São Paulo - SP - 01018-010 - (11) 3111-1040