INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

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Boletim - 188 - Julho / 2008





 

Coordenador chefe:

Carina Quito

Coordenadores adjuntos:

André Pires de Andrade Kehdi, Caroline Braun, Cecília Tripodi, Eleonora Rangel Nacif, Fabiana

Conselho Editorial

Editorial

A esperada reforma processual penal

O velho Código de Processo Penal, concebido no início da década de 40 do século XX, em pleno Estado Novo, está em vias de sofrer profunda modificação.

As Leis ns. 11.689, 11.690 e 11.719, publicadas no Diário Oficial respectivamente em 10 de junho (as duas primeiras) e 23 de junho (a última), representam o resultado parcial da chamada “reforma processual penal”.

O IBCCrim sempre propugnou pela idéia de um projeto de Código de Processo Penal inteiramente novo, por entender que se faz necessária uma mudança estrutural na vigente Lei Processual, cujos princípios não estão em consonância com aqueles estabelecidos na vigente Constituição da República, que em outubro próximo completa vinte anos.

Esta não foi, porém, a solução adotada pela Comissão de Reforma, que, como se sabe, apresentou ao Ministério da Justiça oito anteprojetos em 2001, três dos quais, após sete anos, agora se transformaram em lei. Dois outros projetos, voltados aos temas de prisão e medidas cautelares e recursos, ainda aguardam aprovação no Congresso Nacional.

As modificações ora aprovadas são profundas. Inspiradas no Código Modelo de Processo Penal Ibero-Americano, que serviu de base para a reforma levada a efeito na última década em diversos países latino-americanos, as novas leis tratam do procedimento do júri, da prova e do procedimento em geral, e objetivam modernizar o processo penal e alcançar a tão esperada celeridade e efetividade.

A reforma estabelece novo paradigma para o processo penal brasileiro, a saber: a) as formalidades inúteis do atual procedimento do júri, que mais têm se prestado a servir como fonte inesgotável de nulidade, foram eliminadas; b) a atuação de assistentes técnicos indicados pelas partes passa a ser admitida; c) o juiz poderá absolver sumariamente o acusado, após a apresentação da resposta preliminar; d) a identidade física do juiz passa a existir também no processo penal; e) o art. 594 do Código de Processo Penal, que prevê o recolhimento do acusado à prisão para poder apelar, é finalmente revogado; f) a citação por hora certa, na hipótese do acusado se esquivar, dolosamente, do chamamento pessoal, é permitida; g) o interrogatório do acusado, como meio de defesa que é, passa a ocorrer somente após a oitiva de todas as testemunhas; h) o juiz poderá determinar, na sentença, o valor da indenização à vítima, sem necessidade de processo de liquidação, quando for de fácil constatação o quantum do prejuízo sofrido pelo ofendido; i) a testemunha ou o ofendido que tiver temor de depor na presença do acusado será inquirida mediante videoconferência e, somente na impossibilidade dessa forma, o acusado será retirado da sala, dentre outras novidades.

Deverá merecer especial atenção do magistrado criminal a disciplina das provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. São elas inadmissíveis, segundo o texto constitucional, assim como o são as provas derivadas das ilícitas. As novas disposições contidas no art. 157, §§ 1º e 2º, do CPP, da forma como redigidas, poderão trazer problemas no tocante à chamada “fonte independente de prova”, tida pelo legislador como “aquela que por si só, segundo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova”. Caberá à doutrina e à jurisprudência importante papel balizador do que se deve considerar prova contaminada, diante do texto aberto e genérico da lei.

A reforma não se fará, certamente, sem percalços. Já se discute a aplicação do direito intertemporal, principalmente no procedimento do júri, com a revogação do recurso do protesto por novo júri. Outros problemas também serão enfrentados, em especial nos processos em andamento, cujos procedimentos são bem diversos daqueles que entrarão em vigor no mês de agosto de 2008. Um dos questionamentos imbrica-se com a aplicação imediata da lei processual penal e a possibilidade de restar ferida norma de cunho penal e processual.

O debate é rico e, sem dúvida, contribuirá para o progresso democrático do processo penal. A reforma traz tantas novidades que, antes mesmo de sua promulgação, tem gerado polêmicas. O IBCCrim dá início aos debates com este Boletim, possibilitando ao leitor tomar contato com as primeiras idéias e críticas a respeito de importantes aspectos das novas leis, que se acham no período de sessenta dias de vacatio legis.

IBCCrim, ela aí está. O que se espera é que seja, acima de tudo, instrumento de garantia da dignidade humana e de respeito à Constituição da República.



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