INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

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Boletim - 159 - Fevereiro / 2006





 

Coordenador chefe:

Mariângela Gama de Magalhães Gomes

Coordenadores adjuntos:

André Pires de Andrade Kehdi, Andréa Cristina D’Angelo, Leopoldo Stefanno Leone Louveira, Lui

Conselho Editorial

Editorial

Projeto de lei das interceptações telefônicas e liberdade de imprensa

Decorrida uma década da vigência da Lei nº 9.296, de 1996, que cuida das interceptações de comunicação telefônica, informática e telemática, tornou-se consenso a sua insuficiência para regular a matéria e, sobretudo, coibir os abusos e ilícitos verificados, quer pela banalização da utilização da interceptação telefônica como meio de prova, quer pela falta de tratamento adequado da comunicação informática e telemática, ou ainda pela disseminação de interceptações ilícitas e divulgações, pela imprensa especialmente, de material interceptado ilicitamente ou mesmo licitamente, mas acobertado por segredo de justiça.

Nesse quadro, tornou-se praticamente unânime a defesa da elaboração e aprovação de um projeto de lei, que melhor cuidasse do tema. E, sobretudo, reprimisse e prevenisse os comportamentos ilícitos até aqui observados.

O projeto de lei apresentado pelo Ministério da Justiça visa exatamente atender a esses anseios, aperfeiçoando regulamentação existente. Referido projeto traz um significativo avanço ao prever e regular a captação de conversas com maior segurança, em face das novas técnicas de comunicação. É marcado também por uma forte preocupação em inibir, coibir e punir todas as formas ilícitas de interceptações ou captações de conversas, que têm sido frequentes. A esse respeito, o projeto adota meios legais e eficazes de regular e punir, desde a interceptação ilegal de conversas por telefone e conversas presenciais até a ilegal captação de dados de informática. Outro avanço da lei é permitir que a gravação de conversas realizada por um dos interlocutores, mesmo sem o conhecimento do outro, possa ser utilizada para exercício regular de um direito.

Entretanto, não se tem poupado críticas ao projeto, alegando-se que nele está-se adotando verdadeira forma de censura à imprensa. Isto porque ele tipificou como crime a conduta daquele que divulga produto da interceptação telefônica obtido ilicitamente, bem como obtido de forma lícita, mas acobertado por segredo de justiça.

Primeiramente é preciso esclarecer que o projeto não veda, coíbe ou incrimina qualquer gravação ou interceptação feita de modo lícito. De outra parte, se é crime efetuar interceptação telefônica fora das hipóteses e formas previstas em lei, para fins que não sejam de apuração de infrações penais e com autorização judicial, não menos delituosa é a utilização do produto desse crime, tais co¬mo as conversas e dados obtidos com essa prática ilegal. Daí a preocupação expressa no projeto de punir quem realiza o ato ilícito, mas também quem, de qualquer forma, utiliza-se do material dele advindo.

Portanto, o projeto traça uma linha divisória muito clara entre o lícito e o ilícito. No âmbito da licitude, seja para a interceptação ou gravação, tudo é possível, desde sua captação até sua utilização e divulgação. Porém, para todas as formas de atividades ilícitas de captação de conversas ou dados de informática, símbolos, caracteres, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza, o projeto pune não somente quem realiza a operação ilegal, mas também todos aqueles que se utilizarem do produto desse crime, seja obtendo vantagem direta ou apenas divulgando o resultado desse crime. A única limitação prevista no projeto para utilização ou divulgação de captações lícitas ocorre se for decretado o sigilo nas investigações ou no processo penal.

Assim, decorre claramente do projeto que nada há nele que possa ser interpretado como censura aos meios de comunicação. Em síntese, o projeto é uma forte censura aos atos ilícitos e não à imprensa. É decorrência dos princípios da legalidade e da igualdade que, seja quem for que pratique conduta ilícita, deverá ser punido, sendo ou não integrante da imprensa. Esta é a premissa básica de um Estado Democrático de Direito, que não pode admitir que a imprensa, que tão relevante papel nele desempenha, apoie e fomente a realização de interceptações e gravações ilícitas ao se utilizar do produto ou resultado desse delito como matéria-prima de seu trabalho.



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