INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

     OK
alterar meus dados         
ASSOCIE-SE


Boletim - 152 - Julho / 2005





 

Coordenador chefe:

Mariângela Gama de Magalhães Gomes

Coordenadores adjuntos:

Andréa Cristina D’Angelo, Leopoldo Stefanno Leone Louveira, Mariângela Lopes Neistein, Paulo

Conselho Editorial

Editorial

Uma janela de oportunidade

A divulgação dos indicadores estatísticos do Poder Judiciário brasileiro pelo Supremo Tribunal Federal, cujos dados se referem ao ano de 2003, tendo sido fornecidos pelos próprios Tribunais estaduais e federal, abriu, no Estado de São Paulo, onde os números se apresentaram de forma mais negativa, a discussão para o alto índice de congestionamento da 2ª Instância do Judiciário estadual com um acúmulo de cerca de 600 mil recursos no Tribunal de Justiça nos últimos anos.

Diagnosticado esse congestionamento, ou melhor, trazidos à luz esses números, vários seminários têm discutido quais teriam sido os problemas e mazelas que levaram o Judiciário Paulista a registrar números tão negativos. Segundo uma das conclusões do I Fórum de Tecnologia, Gestão e Inovação da Justiça, realizado em Brasília no final de maio, e promovido pelo Instituto Nacional da Qualidade Judiciária (INQJ), a agilidade do sistema judiciário depende da modernidade do seu sistema de gestão e essa modernidade está necessariamente, mas não exclusivamente, atrelada à informatização dos Tribunais.

Importante, contudo, é especificar o que se entende por informatização dos Tribunais. Pode significar apenas a informatização dos procedimentos judiciais, ou seja, que o advogado e partes tenham acesso ao processo de forma mais ágil, por meio de seu computador o que, sem dúvida, é importante, mas não pode ser visto como sinônimo de uma boa prestação jurisdicional. Uma boa prestação da justiça aos cidadãos é muito mais do que isso, refere-se efetivamente ao acesso ao Judiciário para o atendimento de suas demandas, a forma pela qual, na esfera criminal, a Polícia, o Ministério Público e o Judiciário se voltam para a resolução dos conflitos criminais. Isso implica modelos de gestão e canais de acesso mais ágeis e pautados pela necessidade de tratamento pormenorizado, mesmo nos casos que exijam maior dedicação das Instituições da Justiça e que, por isso, poderiam comprometer, em tese, a demanda por produtividade, que muito motiva as justificativas para a modernização tecnológica em andamento nos Tribunais.

Por detrás de sistemas automáticos e plataformas tecnológicas reside um dos requisitos básicos do Estado Democrático de Direito, qual seja, o da transparência, que não pode apenas ser anunciado como intenção e precisa permitir o devido accontability sobre fluxos de funcionamento e critérios de classificação e de tomada de decisões sobre o modo de operação cotidiana do sistema de Justiça brasileiro. Nestes termos, uma pesquisa da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas identificou, por exemplo, 1.084 classes para a classificação dos processos pelo Judiciário Paulista, o que faz suscitar a indagação: qual o significado e, até mesmo, qual a utilidade prática de se dispor de tantos códigos? Assim, devemos atentar para a importância de não se in­formatizar o caos, ou seja, não informatizar processos burocráticos que não fazem mais sentido e ainda, mesmo dificultando o trabalho dos operadores do direito, são mantidos, em nome da tradição e dos costumes.

Se os números colhidos pelo Banco Nacional de Dados do Poder Judiciário (BNDPJ) do Supremo mostram a Justiça Paulista como uma das que está mais atrasada no processo de informatização, isso pode ser visto de uma forma positiva, como uma janela de oportunidade, na qual os órgãos responsáveis pela prestação da Justiça venham a conversar sobre uma efetiva prestação jurisdicional. Não seria esse o momento adequado para se discutir, por exemplo, a criação da Varas Criminais especializadas em crimes contra a Administração Pública? Como podemos esperar que o juiz analise, de modo condizente, um processo criminal de corrupção, em sentido lato, se a sua mesa está repleta de processos de furtos, roubos e estelionatos e, ainda, quando a sua produtividade, como já foi dito, é medida em termos de quantidade de sentenças proferidas no mês?

Enfim, o IBCCRIM entende que os números que vêem sendo divulgados, não obstante correrem riscos de trazer informações que necessitam, em alguns casos, de retificação, têm o grande mérito de desnudar processos “naturalizados” e publicizar — para o debate republicano sobre regras democráticas de Governo — os mecanismos cotidianos de operação do nosso sistema de Justiça. Oxalá os números e estatísticas se transformem numa constante e possam influenciar as decisões dos dirigentes das Instituições de Justiça de nosso País.



IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - Rua Onze de Agosto, 52 - 2º Andar - Centro - São Paulo - SP - 01018-010 - (11) 3111-1040