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IBCCRIM divulga nota sobre a aprovação do "pacote anticrime" no Senado

Publicado em 15/12/2019

O Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) compõe a campanha “Pacote Anticrime: Uma solução Fake” e desde fevereiro de 2019 vem impulsionando debates acerca das propostas estabelecidas no projeto de lei apresentado pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. O IBCCRIM elaborou, em abril do presente ano, uma nota técnica sobre as medidas, argumentando e embasando fundamentadamente os posicionamentos institucionais sobre as inconstitucionalidades, problemas técnicos e de operacionalização, inclusive, referente à possibilidade de reapresentação das proposituras, quando cabível.

Desde a divulgação inicial do “pacote”, a ausência de dados e/ou estudos que evidenciassem a relação de causalidade entre a modificação legislativa e os objetivos pretendidos foi denunciada. O mesmo tem sido feito com a postura antidemocrática que norteou todo o processo de tramitação e aprovação do projeto, de modo que a rasa profundidade dos debates e a falta de transparência impediram a devida compreensão da sociedade quanto aos reais objetivos da reforma; situação que se mantém, tendo em vista a possibilidade de continuação do projeto original em tramitação no Senado Federal (PL 1864/2019).

O projeto, em verdade, consiste em um pacote de endurecimento penal e intensificação de violências institucionais contra grupos vulnerabilizados, majoritariamente negros e pobres. Contudo, a despeito dos esforços coletivos em denunciar os graves retrocessos concretizados pela proposta, que aprofundam violações de direitos e ferem a dignidade de milhares de pessoas negras e periféricas, e da mobilização de diversos setores da sociedade, o referido “pacote anticrime” foi aprovado por aqueles que, constitucionalmente, deveriam representar os interesses coletivos e sociais no Poder Legislativo.

Após ter sido homologado pelo Plenário da Câmara dos Deputados, o relatório oriundo do Grupo de Trabalho Penal e Processual Penal formado apenas por parlamentares - em sua maioria homens brancos - foi incluído extrapauta na sessão de 10 de dezembro da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania - CCJ, do Senado Federal. Tendo recebido o nº 6.341/2019, o texto foi aprovado sem modificações e, posteriormente, sancionado pelo Plenário do Senado Federal na sessão do dia seguinte, sem qualquer discussão. O projeto agora segue para sanção presidencial, e caso sejam realizados vetos, retorna para análise em sessão conjunta do Congresso Nacional.

A articulação da campanha “Pacote Anticrime: Uma solução Fake”, com destaque ao envolvimento de grupos de familiares e de vítimas da violência do Estado, possibilitou a retirada de algumas propostas trazidas no projeto inicial, como a excludente de ilicitude a agentes de segurança, que representava verdadeira autorização para matar, o “plea bargain”, espécie de acordo entre acusação e defesa para que a pena seja antecipada sem a necessidade do devido processo legal, princípio constitucional, e a execução antecipada da pena de prisão, difundida como “prisão em segunda instância”.

O debate empreendido pela mobilização coletiva da qual o IBCCRIM faz parte também permitiu apontamentos sobre a necessidade de manutenção das audiências de custódia, instrumento fundamental ao combate de prisões ilegais ou arbitrárias e da averiguação de tortura na atuação policial, e de criação de um “juiz de garantias”, responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos fundamentais da pessoa acusada.

No entanto, foram mantidas no texto final do “Pacote Anticrime” inúmeras alterações que, certamente, aprofundarão as marcas do racismo estrutural e da seletividade inerentes ao nosso sistema de justiça criminal. Diante da enorme gama de medidas prejudiciais aprovadas, destacam-se as relativas à execução da pena, como o aumento dos lapsos para a progressão de regime, a criação de um banco genético e o aumento do tempo máximo de cumprimento de pena para 40 anos, bem como as limitações à saída temporária e ao contato de familiares com a pessoa presa. Ainda cabe ressalva à inclusão de regras mais rígidas ao regime disciplinar diferenciado e à possibilidade de prisão imediata após decisão do Tribunal do Júri em condenações superiores a 15 anos, dentre muitas outras.

Importante destacar que medidas já declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal e afastadas no GT Penal e Processual Penal foram reinseridas pelo Plenário da Câmara dos Deputados, como a vedação à liberdade provisória de reincidentes ou de “criminosos habituais” e a possibilidade de flagrante com agente policial provocador. No mais, o PL 1.864/2019, texto original do “Pacote”, continua a tramitar no Senado Federal sem as modificações realizadas pelo Grupo de Trabalho da Câmara dos Deputados. Assim, propostas hoje retiradas do projeto aprovado nas duas casas legislativas ainda podem ser retomadas.

Diante desse panorama, o IBCCRIM reafirma seu compromisso com o diálogo e com a resistência a retrocessos, em atuação que seguirá guiada pela produção qualificada de conhecimento, pela mobilização alinhada aos mais diversos setores da sociedade e, primordialmente, pela defesa de valores democráticos e anti-discriminatórios.


        


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