Publicado em 24/04/2018
Na noite de 11 de maio, sexta, às 18h, pesquisadora participará da estreia do projeto “Biblioteca Convida” do IBCCRIM, apresentando seu novo livro “O que é encarceramento em massa?”
O projeto “Biblioteca Convida” do IBCCRIM promove na noite de 11 de maio, sexta-feira, a partir das 18h, novo evento de lançamento do livro “O que é Encarceramento em Massa?”, escrito por Juliana Borges. A obra integra a coleção Feminismos Plurais, coordenada pela filósofa Djamila Ribeiro, pela Editora Letramento, com o selo Justificando.
Para se inscrever no evento, clique aqui: www.ibccrim.org.br/eventos
O livro é um convite para a discussão das principais pesquisas e formulações dos movimentos negros no país sobre sistema de justiça criminal e o fenômeno do encarceramento em massa. Para aquecer a conversa e reforçar o convite a todas e todos que se interessam pelo tema, o IBCCRIM entrevistou a autora:
IBCCRIM: Como esse novo livro discute a política de encarceramento em massa no Brasil? A pesquisa revela novidades sobre a violência contra a população negra?
Juliana Borges: O livro procura abordar que não há como discutir sistema de justiça criminal no Brasil sem discutir de modo interseccional raça, gênero, temáticas como violência e a problematização sobre a perpetuação das desigualdades. A explosão de pessoas em situação prisional no Brasil ocorre, principalmente, após 2006 e a aprovação da chamada "Nova Lei de Drogas" (11.343/2006). Se por um lado, a lei apresenta o avanço na descriminalização do usuário, por outro ela apresenta um imenso retrocesso ao endurecer a lei relacionada a criminalização da prática do tráfico de drogas, considerada, então, crime hediondo.
A não regulamentação e o não estabelecimento específico sobre a aplicabilidade da lei, deixando para policiais e delegados de polícia a definição de como autuar uma pessoa portando drogas, fez com que tivéssemos sempre aplicada a pessoa negra o flagrante tipificado como tráfico.
Dados demonstram que até houve uma diminuição no encarceramento por tráfico logo após a aprovação da lei, mas de pessoas brancas. Pessoas negras, pelo contrário, foram cada vez mais encarceradas sob a justificativa de tráfico. Com isso, 62% da população prisional é composta por pessoas negras, 50% delas não terminaram o ensino fundamental, 50% delas estavam desempregadas no momento da prisão, a maioria delas portava pequenas quantidades, o que fica demonstrado na maioria das penas em até 8 anos.
Ou seja, estes números demonstram uma criminalização de vidas precárias, de pessoas em contexto de alta vulnerabilidade. Em vez de garantirmos direitos, estamos criminalizando pessoas que, de fato, não apresentam risco à sociedade. O resultado é, portanto, maior precarização das vidas negras e as prisões como um braço importante em um projeto político de extermínio da população negra.
IBCCRIM: Quais são os fatores que explicam o crescimento de 567,4% da população feminina em presídios brasileiros? Existe uma perspectiva étnico-racial entre as mulheres em presídios?
Juliana Borges: Sim, existe. Este aumento exponencial pode ser explicado por diversos fatores. Vejo uma ponta importante na feminização da pobreza, um fenômeno que ocorre não apenas no Brasil, mas no mundo, com as crises econômicas, instabilidade maior no trabalho para as mulheres decorrentes de uma cultura machista e patriarcal na sociedade, além das mulheres comporem os piores postos de trabalho e ainda ganharem salários piores que os homens, mesmo cumprindo as mesmas funções.
Desmistificando a economia das drogas e a vislumbrando como é, de fato, um mercado, com relações comerciais, muitas destas mulheres, pelas condições precárias aliadas a falta de serviços públicos básicos, acabam trabalhando no varejo do tráfico, já que são, em sua maioria, chefes de suas famílias e responsáveis pelo sustento de seus familiares.
O elemento racial está fortemente marcado, ao vermos que 68% das mulheres em situação prisional são negras. E, se formos analisar as sutilezas e mecanismos do racismo, eles operam também no interior do sistema prisional, haja vista que, por terem escolaridade menor em relação às mulheres brancas, estas mulheres negras encontrarão uma série de dificuldades para conseguir remissão de pena. A precariedade de suas vidas também faz com que elas tenham mais dificuldades para conseguir aguardar julgamento em prisão domiciliar, devido a sua instabilidade e situação de não terem moradias próprias. Muitos são os problemas e muitas são as formas de reorganização da ideologia racista atuando em um sistema que existe para manter desigualdades baseado em hierarquias raciais.
IBCCRIM: Como sua pesquisa foi realizada, para investigar se e como a Justiça Criminal tem uma conexão muito forte com o racismo?
A série, bem como este tema para ser tratado, surge da necessidade que vemos de dar visibilidade e apresentar questões sob a perspectiva do olhar do feminismo negro. O livro, portanto, tem uma característica importante de, a partir de uma linguagem simples, objetiva, introduzir as leitoras e leitores em temas que são centrais na formulação e pensamento produzido por mulheres negras para o enfrentamento do racismo, construção e luta por liberdade.
Nesse sentido, o livro é resultado de uma pesquisa das principais produções e estudos da intelectualidade negra, notadamente das mulheres negras sobre o Sistema de Justiça Criminal, Violências, Desigualdades e Racismo. Além disso, foi utilizado material de diversos movimentos e ativistas negras e negros na área de Direitos Humanos, Gênero, Relações Étnico-Raciais, Segurança Pública, etc. Os dados foram coletados, principalmente, dos dois relatórios do InfoPen, do Departamento Penitenciário Nacional, anteriormente lotado no Ministério da Justiça e, hoje, no Ministério da Segurança Pública, publicados em 2014 e 2017, além de diversas outras pesquisas como do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Instituto Terra, Trabalho e Cidadania, Mecanismo Nacional de Combate à Tortura, IBBCRIM, Mapa da Violência e diversos outros relatórios e estudos de entidades da área.
Os principais estudos balizadores do livro foram de Angela Davis, Michelle Alexander, Ana Luiza Pinheiro Flauzina, Vilma Reis, Carla Akotirene e Thula Pires, entre outras.
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