Instituto Brasileiro de Ciências Criminais defende que pacote do MPF pode implicar em recrudescimento penal e retrocesso
No início da semana, o ministro da Justiça Alexandre de Moraes (PSDB) afirmou que o governo avalia de forma favorável as 10 medidas contra a corrupção, de iniciativa no ano passado do Ministério Público Federal. Atento às declarações do ministro, o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) manifesta preocupação quanto às chamadas 10 medidas contra a corrupção por entender que não houve o necessário debate público sobre as medidas, seu conteúdo e sua adequação ao sistema brasileiro; mas apenas a campanha unilateral e propagandística de imaginados êxitos que com elas seriam atingidos.
O IBCCRIM entende que há vários pontos a serem discutidos com mais profundidade, valendo destacar, sinteticamente, os seguintes:
- considerável número de medidas atendem a fins que não se ligam nem indiretamente ao combate à corrupção, e ainda assim atingem pontos centrais aos direitos e garantias dos envolvidos em processos criminais;
- há previsão de meios de convalidação de provas ilícitas, o que significa que a proposta parte de premissa limitada da própria razão de ser da exclusão das provas ilícitas no processo e, também, ofende a norma constitucional que proscreve sua obtenção;
- há previsão de se tratar de simulações de situações para cuidar do que se chamou de “propensão” às atividades criminosas, o que ofende ao estágio já atingido pelo direito penal e direito processual penal, em que qualquer pessoa pode e deve ser julgada pelo que fez e não pelo que tem “propensão” a fazer, sem prejuízo de ser pouco abordada no Brasil a distinção séria e importante entre agente infiltrado e agente provocador. Nesse particular o IBCCRIM chama a atenção à unilateralidade discursiva da qual é permeada a medida, pois há também diplomas internacionais importantes que recomendam a seriedade na abordagem da polêmica medida, não debatida minimamente no Brasil.
- há pretensão de se instituir nova regra de fixação de regime de cumprimento de pena criminal em razão de critérios desconhecidos do sistema brasileiro, ofendendo o método trifásico de fixação da pena sem nem ao menos se tratar da menor discussão com qualquer setor da sociedade a respeito disso, atendendo-se puramente a critérios quantitativos na imaginada forma tabelar de dosimetria da pena;
- há previsão – como se já não bastasse as mais de duas décadas de vigência da lei 8072/90 a provar sua ineficácia – de se tornar a corrupção crime hediondo, imaginando-se que isso sirva de panaceia geral, mas sem se considerar o efeito deletério que significará a medida em termos de superencarceramento;
- há previsão de instituição no Brasil do chamado “sigilo de fonte”, inimaginável figura de informante que não terá a identidade jamais desvelada ao acusado, ferindo de morte o direito de conhecimento da fonte de prova e de exercício do direito ao confronto como sinal de contraditório.
O IBCCRIM acredita, ainda, que outros pontos, como a regulamentação de pedido de vistas nos Tribunais para o andamento mais rápido dos processos, a destinação de recursos à divulgação de pesquisas e de resultados no combate à corrupção e as disposições de normas de ‘accountability’ são medidas que, além de serem mais ligadas ao tema em questão e de cunho em princípio mais eficaz e menos demagógico, poderiam dar ensejo a um debate mais proveitoso.
As 10 medidas contra a corrupção
Trata-se de uma campanha por meio da qual é proposta uma série de alterações legislativas aptas a, no entender do órgão ministerial, tornar o Brasil um país “mais justo, com menos corrupção e menos impunidade”. As medidas foram lançadas à sociedade em forma de um pacote único, cujo conteúdo se revestiria de medidas consideradas imprescindíveis para tornar o ordenamento jurídico mais eficiente no combate à corrupção.