INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

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Boletim - 119 Outubro Esp. / 2002





 

Coordenador chefe:

André Gustavo I. Fonseca

Coordenadores adjuntos:

Andréa Cristina D'Angelo, Carlos Alberto Pires Mendes, Celso Eduardo Faria Coracini, Daniela

Conselho Editorial

Editorial

A idéia que deu certo

Carlos Vico Mañas

Juiz do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo. Ex-presidente do IBCCRIM.

O IBCCRIM completa seu décimo ano de vida. Muitas avaliações podem ser feitas e o leitor, com certeza, as encontrará nos artigos que compõem esta edição comemorativa do Boletim.

Alguns lembrarão da atuação política desenvolvida no período, sempre na defesa dos princípios, direitos e garantias fundamentais inscritos na Constituição Federal, nosso principal objetivo estatutário. Para aqueles que tiveram o privilégio de participar da assembléia de fundação, é curioso recordar as circunstâncias históricas que propiciaram a criação do IBCCRIM e que já parecem tão distantes. Acabávamos de presenciar o inédito e exemplar impedimento de um Presidente da República, assistindo a consolidação das instituições democráticas, reconquistadas após longa fase de regime ditatorial. Vivíamos também o triste episódio do massacre, por forças policiais, de cento e onze presos da Casa de Detenção de São Paulo, dado vergonhoso da história paulista e brasileira. O País e o mundo mudaram neste decênio, passamos a conviver com o fenômeno da globalização e inúmeras outras violações aos direitos humanos foram presenciadas, muitas partindo do próprio Estado. O Instituto, em maior ou menor escala, procurou denunciar e discutir as questões deste novo tempo. E este papel, sem dúvida, continua sendo a nossa missão e principal desafio.

Outros ressaltarão a luta por um direito penal mais humano, que efetivamente exerça a função de tutela de valores de forma justa e igualitária, daí decorrendo as bandeiras do garantismo e da intervenção penal mínima, submetida aos princípios da fragmentariedade e da subsidiariedade, conseqüências naturais da garantia constitucional da legalidade em matéria penal. Tudo em nome da preservação da dignidade humana e da liberdade.

A meu ver, no entanto, uma outra análise ainda é possível. E resulta da constatação de que, apesar de todas as dificuldades, projetos idealistas como o do IBCCRIM podem firmar-se no cenário nacional e internacional, bastando, para tanto, a identidade de propósitos e a comunhão de esforços de abnegados colaboradores. Com efeito, não dispuséssemos do material humano que, com o passar dos anos, foi se agregando ao Instituto, nenhuma iniciativa teria sido levada adiante. Foram essas pessoas que, unidas por um mesmo sonho, possibilitaram o sucesso da empreitada lançada há dez anos. É com a desinteressada dedicação do tempo e trabalho desses colaboradores que o Instituto pôde alcançar a consolidação.

Em outras palavras, parece que a maior lição é a de ser possível à sociedade organizada, diante da inércia estatal, sedimentar projetos de interesse público nas mais diversas áreas. No nosso caso, fica a conclusão de que se pode produzir ciência e conhecimento fora da universidade, talvez até por conta da crônica omissão desta.

Nesse contexto, coube-me fazer pequeno apanhado das realizações do IBCCRIM nesta década, todas levadas a efeito, é sempre oportuno reiterar, sem qualquer subvenção estatal e apenas, basicamente, com o recursos provenientes das mensalidades de nossos cerca de 4.600 sócios, espalhados por todo País.

Hoje, o Instituto conta com sede própria, ocupando boa parte de antigo e simpático edifício no coração de São Paulo. De única funcionária, passamos a considerável equipe de empregados, entre eles alguns de nível superior, como bibliotecário, socióloga, jornalista e profissional de relações públicas.

O sonho de contarmos com publicação própria redundou no boletim mensal, editado ininterruptamente desde o início, e que já está no número 119, com tiragem de 21.000 exemplares, superior, portanto, a muitos veículos da grande imprensa. Constitui, pela rapidez com que as inovações legislativas, doutrinárias e jurisprudenciais são comentadas, indispensável instrumento de trabalho para o operador jurídico nacional.

A Revista Brasileira de Ciências Criminais, com o apoio da Editora Revista dos Tribunais, firmou-se na cenário editorial. Chegou ao número 39, com periodicidade trimestral absolutamente respeitada, fato inédito no País. A RBCCRIM, em obediência a outro de nossos objetivos estatutários, tem atuado como instrumento de difusão da tese de ser imprescindível a visão multidisciplinar da problemática criminal, superando-se a prepotente idéia de que caberia ao Direito Penal o papel principal de compreensão do fenômeno, servindo as demais áreas do conhecimento humano como meras "ciências auxiliares". Por isso, inúmeros foram os trabalhos publicados na área, por exemplo, da psicologia e da sociologia, reavivando-se, ainda, o interesse pela criminologia, à qual, inclusive, dedicou-se numero especial.

Ainda no campo editorial, publica o Instituto a coleção de monografias, atualmente no número 21, distribuída gratuitamente aos associados, contendo obras de inegável valor científico, muitas delas fruto de reconhecidos trabalhos universitários de doutorado e mestrado.

O Seminário Internacional alcança a sua oitava edição. Com muito esforço, trouxemos ao Brasil os mais conceituados juristas estrangeiros, tornando-os acessíveis fora do circuito universitário. Dezenas de cursos foram realizados pelo País afora, sempre buscando-se a integração entre os estudantes e os profissionais da área.

Convênios foram celebrados com entidades estrangeiras congêneres. Integra o IBCCRIM a Rede Alternativa Latino-Americana, tendo realizado este ano, em Ribeirão Preto, o seu primeiro encontro, com professores e profissionais de todo o continente. A união com o Instituto de Direito Penal Econômico, da Universidade de Coimbra, propiciou a realização de dois cursos de especialização na área, com mestres portugueses. Em parceria com a Universidade de Otawa, do Canadá, ministramos curso de extensão no campo da criminologia.

O Núcleo de Pesquisas já produziu diversos trabalhos, colocando-os à disposição da comunidade científica, tão carente de dados empíricos para o enriquecimento de suas produções. Como exemplo, vale citar a pesquisa "O Judiciário e a Comunidade: Prós e Contras das Medidas Sócio–Educativas em Meio Aberto", a primeira a ser executada apenas com recursos próprios.

A Biblioteca do Instituto, talvez a mais atualizada do País, já conta com acervo de milhares de obras, além de coleções completas das mais importantes revistas internacionais. A consulta a todas as obras é facilitada por completo e inédito banco de dados, possível também por intermédio de nosso "site" na "internet", completo informativo jurídico, diariamente atualizado.

Como se vê, sem que isto nunca tivesse sido esperado por seus fundadores, o IBCCRIM tornou-se uma grande entidade, propiciando a seus associados diversos benefícios. Mas tal não pode levar ao esquecimento de que a nossa bandeira original é a negação de um direito penal expansionista, cada vez mais em voga, e a afirmação de uma intervenção penal mínima, única capaz de preservar os valores fundamentais do ser humano em uma sociedade que almeje ser verdadeiramente justa, igualitária e democrática.

Carlos Vico Mañas
Juiz do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo. Ex-presidente do IBCCRIM.
Professor de Direito Penal



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