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Arrazoados: Caso Nicolau: veja na íntegra o HC pedindo prisão domiciliar e especial e a decisão do STJ de 04/01/01

As opiniões expressas nos artigos publicados responsabilizam apenas seus autores e não representam, necessariamente, a opinião deste Instituto

EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO-PRESIDENTE DO EGRÉGIO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

O advogado ALBERTO ZACHARIAS TORON, brasileiro, casado, inscrito na seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil sob o número 65.371, com escritório na Av. Liberdade, n.º 65/8.º andar - São Paulo (SP), respeitosamente, vem à elevada presença de Vossa Excelência, a fim de impetrar

ordem de habeas corpus

com pedido de liminar adiante explicitado, em favor de NICOLAU DOS SANTOS NETO, brasileiro, casado, Juiz togado aposentado do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, portador da Cédula de Identidade R.G. n.º 925.049 (SSP/SP), residente e domiciliado na cidade de São Paulo (SP) na Rua Amarilis, n.º 183, por estar sofrendo constrangimento ilegal da parte da Excelentíssima Desembargadora Federal da 3ª Região, Dr.ª SYLVIA STEINER que autorizou a sua remoção para cela que não preenche os requisitos da prisão especial, embora reconheça que o Paciente, por ter curso superior, a ela faça jus.

O impetrante arrima-se no disposto pelo artigo 5º, LXVIII, da Constituição Federal e nos artigos 647 e 648, I, do Código de Processo Penal, bem como nos motivos de fato e razões de direito adiante articulados.

Termos em que, do processamento,

Pede deferimento.

São Paulo, 03 de janeiro de 2001.

ALBERTO ZACHARIAS TORON

O.A.B./SP n.º 65.371

EGRÉGIO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

COLENDA TURMA:

DOUTO PROCURADOR DA REPÚBLICA:

I- DO CONSTRANGIMENTO ILEGAL:

1. O paciente encontra-se recolhido na Custódia da Polícia Federal em São Paulo desde o dia 8 de dezembro de 2000, quando apresentou-se espontaneamente a fim de cumprir os dois decretos de prisão preventiva contra ele expedidos pelo eminente Juiz Federal da 1ª Vara Federal Criminal da Seção Judiciária de São Paulo (doc. 1).

2. Desde aquela data, o Paciente permanece no segundo andar do referido estabelecimento, uma vez que segundo o artigo 295, inciso VII, do Código de Processo Penal, “serão recolhidos ... em prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva ... os diplomados por qualquer das faculdades superiores da República”. Ademais, em se tratando de Juiz aposentado ___ fato notório ___ tem a teor do que dispõe o art. 33, inc. III, da Lei Orgânica da Magistratura, direito à prisão em sala de Estado Maior.

3. É certo que o local onde se encontra o Paciente nada mais é que uma “cela especial improvisada”, o que fez com que o ilustre Delegado Regional de Polícia solicitasse do ínclito Magistrado Federal de primeira instância a remoção do Paciente para local adequado ao cumprimento da prisão especial (doc. 2 e 2-A).

4. Assim, referido Juiz determinou que ele fosse transferido a Quartel da Polícia Militar (docs. 3 e 4).

4.1. No entanto, a douta autoridade ora apontada como coatora ___ sem favor nenhum uma das expressões mais ilustres da magistratura federal ___, suspendeu em parte o despacho do eminente Juiz de primeiro grau, autorizando a sua remoção para cela de Distrito Policial incorretamente denominada de especial, que não guarda qualquer respeito com as regras da prisão especial (doc. 5).

5. É certo que a douta autoridade apontada como coatora realçou que “a lei prevê hipótese de prisão especial para presos provisórios portadores de diploma de curso superior, como é o caso do Sr. Nicolau dos Santos Neto (...)”.

6. No entanto, no mesmo despacho, afirmou que tal prisão não precisa ocorrer em quartel da Polícia Militar, como havia sido determinado pelo MM. Juiz de Primeiro grau, e que a prisão deverá ser cumprida “na forma como vêm sendo cumpridas as demais prisões especiais”, a critério da Secretária de Segurança Pública.

7. Sem embargo, ainda que a prisão do Paciente esteja afeita à referida Secretaria, esta não está condicionada à liberalidade ou ao melhor alvitre da autoridade, pois é direito do cidadão assegurado por lei e decreto específico.

Sucede que as ditas prisões especiais na Capital (SP), onde se desenvolvem as ações penais contra o paciente e sua família reside, vêm sendo cumpridas nos 13º e 77.º Distritos Policiais. Tais estabelecimentos, improvisados, não preenchem, nem de longe, os requisitos legais da prisão especial.

Com efeito, embora abriguem outros presos provisórios com curso superior, no que concerne às instalações propriamente ditas, os locais são até piores do que muitos outros reservados a presos comuns. O último distrito aludido é composto de um corredor escuro e úmido, em muito semelhante às masmorras medievais, sem direito, sequer, a banho de sol, fechado por grades.

8. Assim, nem se argumente que a cela para onde ele será removido é especial, uma vez que ficará em companhia de demais presos de curso superior. Na verdade, tal cela é idêntica ou pior que a dos presos ditos comuns. As condições onde ficará o paciente não deveriam ser admitidas para qualquer preso comum, que dirá a quem tem direito a prisão especial e, sobretudo, septuagenário com a saúde debilitada.

9. Ora, eminente Ministro, o que se pleiteia é, obviamente, um direito do paciente e não uma liberalidade da autoridade a qual está afeto o preso. É por isso, que o eminente Prof. TOURINHO FILHO no seu consagrado PROCESSO PENAL, afirma: “Enquanto não houver uma sentença condenatória irrecorrível, não se pode falar em condenação. Sendo medida de exceção, que pode acarretar grave e imerecido dano àquele que a sofre, deve ser aplicada com a maior benignidade possível, e a concessão do art. 295 é consentânea com essa «aconselhável benignidade»” (São Paulo, ed. Saraiva, 6ª ed., 1982, III/357/358). No mesmo sentido o escólio do pranteado Prof. BASILEU GARCIA (“Comentários ao Código de Processo Penal”- art. 295, ed. Forense, Rio de Janeiro, 1945, vol. III, pág. 73/74).

10. Seguindo a determinação da ilustre autoridade ora apontada como coatora, a Secretaria de Segurança Pública estará autorizada a colocá-lo em local inapropriado, em evidente descumprimento à lei.

11. O constrangimento ilegal que o paciente está na iminência de sofrer é manifesto. A sua retirada da prisão especial antes da prolação da sentença ____ portanto, muito longe do trânsito em julgado de qualquer decisão ____, afronta a norma processual penal e a liberdade do cidadão que preenche os requisitos legais para o benefício. Embora a Imprensa faça escárnio da prisão especial, é importante lembrar que os jornalistas gozam desse privilégio e somente poderão ser detidos em “sala decente, arejada e onde encontre todas as comodidades” (art. 66 da Lei de Imprensa).

II – DO CABIMENTO DE HABEAS CORPUS:

12. É evidente o cabimento do habeas corpus a fim de evitar que o paciente venha a ser removido para local inadequado ao cumprimento da prisão provisória, já que tal constrangimento ilegal afronta seu direito de locomoção, ainda que relativo (STJ, 5ª Turma, RHC n.º 1.884-SP, DJ 4/5/92). Expressivo, a propósito, v. aresto oriundo da Col. Primeira Turma do Excelso Pretório:

“A prisão especial, como regime prisional de exceção, com privilégios para determinadas pessoas quando sujeitas a encarceramento antes da condenação definitiva, assegura a elas uma liberdade juridicamente relativa. A ofensa a esse direito constitui, em tese, constrangimento ilegal, a ser corrigido pelo habeas corpus” (RT 583/452).

13. É por isso que o saudoso MAGALHÃES NORONHA leciona que pode ser concedido habeas corpus, com fundamento no inciso I, do artigo 648, do CPP, ou seja, quando não houver justa causa, sempre que “não obstante ser cabível a prisão, é ela cumprida em lugar indevido” (“Curso de Direito Processual Penal”, ed. Saraiva, São Paulo, pág. 547/548).

O E. Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, em acórdão da sua Col. 2ª Câmara, esposou o mesmo entendimento:

“HABEAS CORPUS – Ré internada em manicômio Judiciário – Local inadequado reconhecido – concessão do remédio heróico.

“A garantia do “habeas corpus” é conferida não somente contra a prisão arbitrária, e sim contra todo constrangimento ilegal, ou ele provenha de uma detenção injusta, ou de ser ela verificada em local ilegítimo, em cárcere privado, ou resulte de uma exigência forçada ou opressão que comprima indevidamente a liberdade do cidadão, ou do homem”(JUTACRIM 72/62)

14. O presente “writ” objetiva que o paciente seja colocado em prisão especial e não em simulacro desta que, nas palavras do eminente TOURINHO FILHO, não passa de “infame hipocrisia de Justiça” (Código de processo penal comentado”, SP, ed. Saraiva, 2ª ed., 1997, I/469) ou sala de Estado Maior até o trânsito em julgado das ações penais a que responde ou, à falta destas, em prisão domiciliar nos termos do artigo 1.º da Lei n.º 5.256/67.

14.1. A esse respeito esta E. Corte já decidiu:

"Proclamado pelo acórdão o direito do paciente à prisão especial (art. 89, V, da Lei 4.215/63) e inexistindo na comarca local adequado, único obstáculo oposto à efetivação do benefício, deve ser ele recolhido à prisão domiciliar (art. 1º da Lei 5.256/67). Recurso de habeas corpus a que se dá provimento para conceder a ordem" (RHC 680-SP, 5ª T., rel. Min. ASSIS TOLEDO, j. 8.8.90, DJU 20.8.90, p. 7.972, RT 663/344).

14.2. Também o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, em casos análogos, tem se manifestado:

“ADVOGADO - Prisão especial - Inexistência de estabelecimento adequado na comarca como único obstáculo à efetivação do benefício - Recolhimento em prisão domiciliar até o trânsito em julgado da sentença condenatória - Aplicação dos arts. 89, V, da Lei 4.215/63 e 1º da Lei 5.265/67. "Embora tenha o advogado direito a prisão especial, inexistindo na comarca local adequado, único obstáculo oposto à efetivação do benefício, deve ser ele recolhido à prisão domiciliar até o trânsito em julgado da sentença condenatória" (HC 97.992-3 - 1ª C. - j. 24.9.90 - rel. Des. JARBAS MAZZONI - RT 664/276).

É de rigor realçar que a colocação do paciente em prisão domiciliar não traz qualquer risco de fuga porque, tendo se apresentado espontaneamente e, portanto, pondo fim à situação em que vivia anteriormente, não vai voltar à condição de foragido quando estará em sua própria residência na qual, desde logo, admitirá a presença de quantos agentes a Polícia Federal considerar necessário para vigiá-lo.

III – DO PEDIDO DE LIMINAR:

15. Demonstrado o “fumus boni iuris” por toda a argumentação acima expendida, reside o “periculum in mora” no fato de o Paciente, homem de 72 anos, que se apresentou espontaneamente para o cumprimento da prisão e tem sua saúde combalida, encontrar-se na iminência de ser transferido para local infecto, que não preenche nem minimamente as condições legais da prisão especial, podendo, inclusive, oferecer risco maior à sua saúde, em manifesto descumprimento à norma legal.

15.1. Ressalte-se que o prazo fixado pela douta autoridade coatora expira amanhã podendo a transferência dar-se a qualquer momento.

16. Assim, a medida que se quer impor ao paciente contraria a norma processual penal, bem como o direito constitucional de respeito ao preso previsto no artigo 5º, inciso XLIX, que procura proteger e evitar a deletéria “... convivência de réus primários com criminosos da pior espécie nos deficientes presídios do Estado, como é do notório conhecimento”(Des. MÁRCIO BONILHA, RJTJSP, Lex 79/359).

É por isso que o Colendo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, tem há muito advertido:

“(...) desde que tem diploma de nível superior, faz jus a prisão privilegiada, enquanto não definitivamente condenado.

Interpretação do artigo 40, caput, da Lei n.º 4.878/65, combinado com o art. 1º da Lei 5.350/67 e do art. 295, VII, Código Proc. Penal.

Provimento do recurso para assegurar a prisão prevista pelo art. 295, VII, do Código Proc. Penal.”(RHC n.º 66.229-3, Rel. Min. DJACI FALCÃO, J. 06.05.88).

Nessa conformidade, sendo manifesto o constrangimento ilegal, aguarda-se seja reconhecido o direito do Paciente à prisão especial nos exatos termos da lei. Em caráter liminar, requer-se seja-lhe concedida a prisão domiciliar, conforme determina o artigo 1.º da Lei n.º 5.256/67, ao menos até que se encontre local adequado ao cumprimento da prisão especial ou, quando menos, sua manutenção na prisão em que se encontra até o julgamento deste writ.

Decidindo desta maneira, Vossa Excelência, como é costumeiro, estará realizando a melhor

JUSTIÇA!

São Paulo, 03 de janeiro de 2001.

ALBERTO ZACHARIAS TORON

O.A.B./SP n.º 65.371

ALEXANDRA LEBELSON SZAFIR

O.A.B./SP n.º 128.582


HABEAS CORPUS Nº 15.648 - SP (2001/0001166-7)

IMPETRANTES: ALBERTO ZACHARIAS TORON E OUTRA
IMPETRADO: JUÍZA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO, RELATORA DA REPRESENTAÇÃO Nº 200103000000040
PACIENTE: NICOLAU DOS SANTOS NETO(PRESO)

D E C I S Ã O
Cuida-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado em favor de Nicolau dos Santos Neto.
Aduzem os Impetrantes, em suma, que:
- Nicolau dos Santos Neto está preso desde o dia 8/12/2000, na Custódia da Polícia Federal em São Paulo, tendo-se apresentado espontaneamente;
- o Paciente faz jus à prisão especial por ter curso superior; além do mais por ser Juiz aposentado, tem direito a prisão em sala de Estado Maior, conforme dispõe o art. 33, inciso III, da Lei Orgânica da Magistratura;
- o Delegado Regional da Polícia Federal solicitou a transferência do Paciente para local adequado ao cumprimento da prisão especial;
- o Juízo de 1º grau determinou a sua transferência para Quartel da Polícia Militar;
- a Juíza Sylvia Steiner, Relatora da Representação nº 200103000000040, suspendeu em parte o referido despacho, autorizando a transferência do Paciente para cela de Distrito Policial “incorretamente denominada de especial” (fl.5);
- os estabelecimentos onde vêm sendo cumpridas as prisões especiais, 13º e 77º Distritos Policiais, não preenchem os requisitos da prisão especial;
- as condições da cela onde ficará o Paciente (dividida com outros presos) não deveriam ser admitidas nem mesmo para presos comuns, quanto mais para os de curso superior.
Liminarmente, “requer-se seja-lhe concedida a prisão domiciliar, conforme determina o artigo 1º da Lei nº 5.256/67, ao menos até que se encontre local adequado ao cumprimento da prisão especial ou, quando menos, sua manutenção na prisão em que se encontra até o julgamento deste writ.” (fl.11).
Relatei. Decido.
Percebe-se claramente que o pedido relativo ao recolhimento domiciliar só foi deduzido em função da aventada transferência prisional, que acabou concretizando-se, aliás, antes mesmo deste habeas corpus ser protocolizado.
Em sede de juízo provisório, sempre que possível e desde que não implique lesão maior do que a que se pretende evitar, recomenda-se o respeito à situação anterior ao constrangimento ilegal apontado.
No caso, verifica-se que a questão nuclear centra-se na alegada inadequação das instalações do local para onde o Paciente foi transferido. Até que essa questão seja definitivamente apreciada pelo Órgão julgador competente no âmbito deste Superior Tribunal, impõe-se, na esteira do que antes afirmei, tornar o Paciente à situação em que se encontrava, ou seja, recolhido a dependências da Polícia Federal em São Paulo.
Nos termos enunciados, defiro parcialmente a medida liminar.
Comunique-se com urgência.
Solicitem-se informações. Após, vista ao Ministério Público.
Findas as férias, sejam os autos conclusos ao Ministro relator.
Intimem-se.
Brasília, 4 de janeiro de 2001.

Ministro Paulo Costa Leite
Presidente



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