As opiniões expressas nos artigos publicados responsabilizam apenas seus autores e não representam, necessariamente, a opinião deste Instituto
Excelentíssima
Senhora Juíza de Direito da 5ª Vara desta Comarca,
IPL
n.º 2001014236
Indiciado:
F. B. S.
Vítima:
O ESTADO
Cap.
penal provisória: art. 10 § 1º, II da Lei
9437/97
O
Ministério Público Estadual, através da Promotora de Justiça, ao final
assinada, no uso de suas atribuições constitucionais, vem, respeitosamente,
perante V.Exa., com fulcro no art. 28 do CPP, requerer o ARQUIVAMENTO da peça
informativa em anexo, pelos fatos e fundamento a seguir exarados:
I – DOS FATOS
Consta
dos autos que, no dia 08 de maio de 2001, policiais lotados na delegacia do Aurá,
teriam recebido informações “de populares” de que F. B. S., suspeito de
haver praticados dois roubos naquela circunscrição, poderia ser encontrado na
residência de nº 58, na quadra 05, no Loteamento Jader Barbalho.
O
Investigador de Polícia Civil PEDRO PAULO FERREIRA DA SILVA e seu colega citado
como Bosco deslocaram-se até o endereço fornecido e, ao baterem à porta,
foram recebidos pelo Indiciado que, imediatamente, foi detido e submetido à
revista pessoal. Em seguida, os policiais passaram a fazer revista na residência,
quando, então, afirmam ter encontrado, no interior de um armário, uma arma de
brinquedo fabricada em plástico preto, o que ensejou a condução e posterior
prisão de F., “em flagrante delito”.
Esse
ilustre Juízo manteve a constrição, justificando não vislumbrar vícios
formais ou materiais no auto e determinou a aplicação do instituto da fiança
pela própria autoridade policial, por se tratar de crime punido com pena de
detenção.
II
– DA ILEGALIDADE DO FLAGRANTE
Concessa
maxima venia, o auto de prisão
em flagrante delito se encontra eivado de vícios, tanto de forma, como de matéria,
que o maculam irremediavelmente, estando a prisão, via de conseqüência,
ilegal, senão vejamos.
Inicialmente,
vê-se, de forma clara, que o Indiciado foi preso de forma totalmente arbitrária,
tendo os policiais que efetuaram a prisão descumprido, inclusive, norma
constitucional.
Diz
o próprio condutor que populares teriam acionado a DP do Aurá, informando que
o Indiciado estaria escondido numa casa, no Loteamento Jader Barbalho, o que
provocou uma diligência policial no sentido de prendê-lo, pelo simples fato de
ser “suspeito” de roubos naquela área.
Sabe-se
que, de acordo com o art. 5º, LXI, da C.F./88, somente se justifica a prisão
nas hipóteses de flagrante delito ou de ordem escrita e fundamentada de
autoridade competente.
No
caso vertente, os policiais procederam à prisão de F. sem qualquer ordem
judicial para tanto e sem estar ele praticando qualquer infração penal. É
imperioso observar que os policiais primeiro prenderam o Indiciado para, somente
depois, efetuarem a revista onde foi encontrada a tal arma de brinquedo.
Na
verdade, a polícia sequer poderia ter entrado na casa do Indiciado sem mandado
judicial de prisão e, da mesma forma, jamais poderia ter procedido à revista
sem ordem judicial de busca e apreensão domiciliar. É de ressaltar que o
condutor sequer menciona provável consentimento do morador (Indiciado),
limitando-se a afirmar que F., ao atender a porta, “não teve tempo de
escapar, pelo que o detiveram e na presença do mesmo fizeram uma revista,
primeiro pessoal e depois na casa” (sic.).
Quer dizer, o morador não teve tempo de esboçar qualquer reação, pois, mal
abriu a porta de casa, foi logo detido e revistado.
Não
é demais lembrar a garantia constitucional da inviolabilidade do domicílio,
prevista no art. 5º, XI, da Carta Magna, in
verbis:
“a
casa e asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem
consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para
prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial” (grifos
nossos).
É
espantosa a arbitrariedade praticada pelos policiais em questão que, no exercício
de tão relevante mister, deveriam zelar pelo cumprimento fiel das garantias
individuais, previstas em nosso ordenamento maior. Porém, ao contrário,
ignoram a Constituição, desrespeitam os direitos fundamentais do cidadão,
procedendo como se, ao invés de um Estado Democrático de Direito, estivéssemos
em franco período medieval, mercê da barbárie e desatinos daqueles que detêm
o poder.
Em
síntese, a prisão efetuada ocorreu antes mesmo dos policiais acharem a arma de
brinquedo que “justificou” o flagrante. Impõe destacar, portanto, que a
invasão à casa de F. – por ter sido totalmente ilegal – jamais poderia
fundamentar o posterior flagrante.
Além
do vício de matéria ora apontado há, ainda, um erro de forma que, igualmente,
macula o auto. A autoridade policial presidente – em total afronta ao espírito
que norteia o instituto da curadoria – nomeou, para funcionar como curador do
Indiciado, que é menor de 21 anos, um investigador de polícia civil (Ivander
Martins Santos), lotado na mesma Seccional Urbana onde estava sendo lavrado o
flagrante (7ª Seccional Urbana – PAAR); procedimento este que, infelizmente,
vem se tornando comum nesta Comarca e que urge ser combatido.
Ë
sabido que quando a nomeação de curador para Indicado menor de 21 e maior de
18 anos recai sobre pessoa subordinada ao Delegado de Polícia que preside o
Inquérito, lotado na mesma unidade policial, está maculado o auto de flagrante
e, via de conseqüência, ilegal a prisão, sendo passível de relaxamento, nos
termos do art. 5º, LXV, da CF/88.
Isto
porque, a prisão em flagrante delito é constrição da liberdade que deriva de
ato administrativo – e não judicial – devendo tal ato, portanto, ser
absolutamente vinculado a todas as formalidades exigidas. Trata-se de um ato
solene, em razão de sua excepcionalidade.
No
que concerne à nomeação de curador – hipótese expressamente prevista no
art. 15, do CPP – urge ter em mente que referida formalidade tem por fim
evitar que o Indiciado, ainda incapaz civilmente (incapacidade relativa), fique
vulnerabilizado pelo procedimento flagrancial. Presta-se, portanto, para
resguardar a legitimidade das declarações a serem prestadas pelo indiciado.
Sendo
assim, por óbvio que esse curador deve ser pessoa estranha aos quadros da Polícia,
notadamente àquele determinado departamento ou unidade onde se está lavrando a
peça informativa.
Nesse
sentido, vejamos a lição de TOURINHO FILHO: “esse
curador pode ser qualquer pessoa sui juris.
Pode ser um parente. Normalmente a Autoridade Policial nomeia um Advogado. A função
desse curador é apenas a de dar assistência ao menor. Sabe-se que nessa idade,
regra geral, os menores são sugestionáveis e, assim, frente a frente
com os policiais, talvez nem saibam fazer valer seus direitos, ignorando-os até.
Sem a necessária maturação biopsíquica e ausente muitas vezes a experiência
da vida, ficariam eles mais desamparados se não houvesse alguém, preferentemente
um parente, posto ser da sua confiança, ao seu lado, durante os atos a que
deva estar presente”. E prossegue: “se o inquérito se iniciar através de
auto de prisão em flagrante, esse auto, como peça coercitiva, perderá toda a
sua validade se não for nomeado Curador ao indiciado menor. É que, em se
tratando de prisão que se realiza sem o controle prévio do Juiz, todas as
formalidades exigidas são ad solemnitatem
e, por isso mesmo, a sua ausência torna imprestável o auto” (In TOURINHO FILHO,
Fernando da Costa. Código de processo penal comentado. 4ª edição ver. E
atual. – São Paulo: Saraiva, 1999. Páginas 57/59) (grifos nossos).
No
mesmo sentido, o julgado abaixo do Colento STJ, de lavra do eminente Ministro
Francisco de Assis Toledo:
“Réu
menor de 21 anos – Prisão em flagrante – Nomeação de curador na pessoa de
escrivão de polícia, lotado na mesma delegacia. Embora a jurisprudência
entenda não invalidar a ação penal a circunstância de recair a nomeação de
curador em pessoa pertencente ao quadro policial, não se pode convalidar o
auto de prisão em flagrante na hipótese dos autos, em que o curador nomeado,
sendo escrivão da própria Delegacia, não estava em condição de exercer o
seu múnus com total independência, nem possuía capacidade postulatória
para atuar em favor do menor. Recurso de hábeas corpus conhecido e provido para
anular-se a prisão em flagrante”
(STJ – RHC – Rel. Assis Toledo – RSTJ 56/371) (In
Código de processo penal e sua interpretação jurisprudencial. Coordenação
Alberto Silva Franco. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 1999. Página
1955) (grifos nossos).
Vê-se,
assim que o fundamento da nomeação de um curador é a necessidade de se
garantir sejam legítimos todos os atos que exigem a presença do indiciado
menor. Destarte, impossível aceitar a nomeação de um funcionário subordinado
à própria autoridade processante, pois, nesse caso, não haverá isenção.
Assim,
resta demonstrado, à saciedade, que o auto de prisão em flagrante delito
lavrado contra o Indiciado está eivado de vícios – de forma e de fundo –
e, por isso, ilegal está a prisão, merecendo ser, de imediato, relaxada por
esse douto Juízo, a teor do que dispõe a norma do art. 5º, LXV, da CF/88.
A
propósito, cumpre mencionar que, apesar desse douto Juízo haver mantido a prisão,
nada impede que venha a relaxá-la, por se tratar de mandamento constitucional
cogente, abstraindo-se, neste caso, as formalidades verificadas em sede de
teoria dos recursos, no que concerne à impossibilidade de revisão do ato pela
mesma instância judiciária.
Ultrapassada
a questão da ilegalidade do flagrante, impende justificar o pedido de
ARQUIVAMENTO.
III
– RAZÕES DO ARQUIVAMENTO
Com
efeito, o Inquérito Policial narra que foi apreendida, em poder de F. B. S.,
uma arma de brinquedo, o que tipificaria a conduta prevista no art. 10 , §1º,
II, da Lei nº 9.437/97 (“utilizar arma de brinquedo, simulacro de arma capaz
de atemorizar outrem, para o fim de cometer crimes”).
Referida
norma penal incriminadora, tão logo entrou em vigor, foi alvo de incontáveis
críticas de abalizados doutrinadores, lado a lado com decisões
jurisprudenciais que, há muito, já se posicionavam em sentido contrário à
novel incriminação.
As
discussões sobre a “arma de brinquedo” não são de hoje, nem datam da Lei
nº 9.437/97. Na verdade, sempre foi objeto de polêmica a causa especial de
aumento de pena prevista no art. 157, §2º, I do CP, que impõe a majoração
quando a violência ou ameaça, constitutivas do roubo, é exercida com o
emprego de arma.
Para
alguns, a “arma de brinquedo” deveria ser entendida como “arma” e,
portanto, incidiria a majorante; muitos outros, em sentido inverso, entendiam,
acertadamente, que não era possível o gravame, sob pena de bis
in idem e de aplicação de analogia in
malan partem, já que a arma de brinquedo, se de um lado justifica a
caracterização do roubo pelo temor que infunde, por outro não legitima o
agravamento da pena, por não possuir potencialidade lesiva.
Infelizmente,
os tribunais passaram a adotar a primeira orientação, o que culminou com a
sumulação da matéria pelo colendo STJ, (súmula 174: no
crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o aumento
de pena).
O
entendimento sumular – apesar das inúmeras manifestações de renomados
penalistas em sentido contrário – foi a mola propulsora da previsão legal
constante do art. 10 , §1º, II, da Lei nº 9.437/97. O legislador ordinário,
em franco simbolismo, desrespeitou princípios constitucionais caros ao Direito
Penal moderno.
A
propósito, é oportuno salientar que a indigitada súmula 174 está sendo
questionada e revista pelo STJ, no Resp 213.054, cujo relator é o Ministro Féliz
Fischer, presidente da 5ª Turma, daquela Casa (GOMES, Luiz Flávio. O processo
de revisão da Súmula 174 do STJ – arma de brinquedo e aumento de pena no
roubo. In
www.direitocriminal.com.br,
03/05/01).
Vive-se,
hoje, em um Estado Constitucional e Democrático de Direito – paradigma
escolhido pela Carta Política de 1988 – no qual, diferentemente do Estado
Liberal, deve-se obediência não à letra fria da lei, mas à ordem
constitucional. É dizer, o juiz, na aplicação da lei, deve, antes de qualquer
coisa, confrontá-la com a Constituição, a fim de verificar se existe
compatibilidade material. Não basta que a lei tenha vigência, é preciso,
acima de tudo, que seja válida, como ensina LUIGI FERRAJOLI, ao expor, com
maestria, as bases da teoria do garantismo penal, em sua obra “Direito e Razão”.
A esse respeito, é oportuno citar um trecho da lição do renomado jurista
italiano:
“Para
que la previsión de un hecho como delito por parte de una ley sea suficiente
para que el juez lo considere como tal, en un estado de derecho es necesario
que la ley sea, además de vigente, también válida, es decir, conforme
a sus normas superiores tanto en el orden formal
como sustancial. Sólo una ley (que el juez considere) válida comporta
para él la obligación de aplicarla, es decir, de calificar y castigar como
delito el hecho previsto por ella. De aí se sigue que un hecho es y debe ser
considerado delito si y sólo si es tal conforme a una ley vigente y válida, o
sea, si concurren todas las garantías penales e procesales(...)” (In Derecho
y razón – teoría del garantismo penal. Prólogo
de Norberto Bobbio. Editorial Trotta. Página 876) (grifos nossos).
No
caso sub examen, temos uma lei
vigente, que é, não obstante, totalmente inválida, por ferir princípios
constitucionais do Direito Penal, tais como a ofensividade e a proporcionalidade
e, por isso, impossível de ser aplicada.
Ao
fabricar o tipo penal em comento, esqueceu-se o legislador, inicialmente, da própria
ratio essendi da lei nº 9.437/97, que é garantir um nível razoável de
segurança coletiva. Quer dizer, para justificar a intervenção do Direito
Penal nas hipóteses delineadas pela lei, mister se faz que a conduta proibida
cause algum dano ao bem jurídico, rebaixando esse nível razoável de segurança.
Pois
bem, no caso da arma de brinquedo, pergunta-se: onde existe ofensa à segurança
coletiva, se o brinquedo (que não é arma, diga-se de passagem) não possui
qualquer potencialidade lesiva? Que lesão pode trazer ao bem jurídico em tela
a utilização de um mero brinquedo, ainda que com o fim de cometer crimes?
Como
se vê, impossível identificar a ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma.
Porém, o legislador ainda atropelou outro princípio inerente ao Direito Penal
moderno: a proporcionalidade.
É
preciso não confundir o objeto jurídico da Lei nº 9.437/97 com os demais
protegidos por outros tipos penais, em que o simulacro de arma é utilizado como
meio de execução (vg., roubo, ameaça, contrangimento ilegal, etc).
Quando
alguém utiliza uma arma de brinquedo, com o fim de cometer crimes, o máximo
que consegue o sujeito ativo é provocar medo na vítima, e isto já está
tutelado pela norma repressiva do crime-fim. Qualquer penalização além disso
é desarrazoada e desproporcional, pois incorrerá em flagrante bis
in idem. De outro lado, quando a arma utilizada é real, além de infundir
temor, o agente provoca dano à segurança coletiva e gera perigo de dano
concreto à integridade física da vítima, na medida em que aquele instrumento
(arma de verdade) possui – para além do simples poder intimidatório –
potencialidade lesiva inquestionável. Há, neste último caso, um plus,
que legitima o tratamento mais rigoroso.
Assim
sendo, criminalizar o uso da arma de brinquedo, como foi feito com a arma de
verdade, é tratar de forma isonômica duas situações flagrantemente
desiguais; é desrespeitar o princípio da culpabilidade, na medida em que se
está impondo a mesma pena a agentes que não se houveram com o mesmo grau de
reprovabilidade na conduta; é ignorar a proporcionalidade; é cometer injustiça,
portanto.
A
propósito, cumpre trazer à colação o entendimento de LUIZ FLÁVIO GOMES a
respeito do assunto. É ler-se:
“Confundiu-se
“potencialidade lesiva” (que é de caráter objetivo) com “capacidade de
atemorizar” (que tem natureza subjetiva). Expressamente a lex
nova reconhece que a arma de brinquedo
ou simulacro de arma pode “atemorizar outrem”. Mas o que justifica
uma criminalização autônoma, com base na realidade social, é a idoneidade da
conduta (do instrumento) não para atemorizar, senão para lesar, ofender,
danificar bens jurídicos alheios. O que está na base do delito do art. 10
da Lei 9.437/97 é a periculosidade
inerente ao instrumento (arma de fogo), que deve ser encarada de per si, não em
relação a outros crimes. Qualquer objeto lesivo, em tese, pode servir para
atemorizar, ameaçar. Mas nesse caso torna-se instrumento do crime cometido, e
jamais pode configurar delito independente, sob pena de violação ao princípio
ne bis in idem (...). Em suma, a arma
de brinquedo serve para a configuração do delito de roubo. E isso já implica
em pena severa para o autor do fato. É o quanto basta. É o quanto a
proporcionalidade permite. Querer, no entanto, extrair da arma de brinquedo
mais do que isso significa violar a natureza das coisas, isto é adotar postura
equivocada, sem base estatística, sem fundamento criminológico ou empírico ou
experimental. Por não ser arma de fogo, com real potencialidade lesiva,
parece evidente que a arma de brinquedo não pode nem sequer agravar a pena do
delito de roubo (quanto mais configurar crime autônomo). Nossa posição,
como se percebe, distancia-se da Súmula 174 do STJ” (In
Lei das armas de fogo (comentários). Luiz Flávio Gomes, William Terra de
Oliveira. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998. Páginas 170/171)
(grifos nossos).
E
conclui, brilhantemente, o penalista pátrio:
“Em
suma: seja porque o legislador ignorou a verdadeira ratio
essendi da criminalização da arma de fogo, seja porque acabou descrevendo
conduta caracterizadora de um crime impossível, só nos resta considerar
letra morta o disposto no art. 10 ,
§1º, II, da Lei nº 9.437/97, pois nele reside inequívoca violação ao princípio
da ofensividade, que tem cunho constitucional, porque no fundo, nada mais
representa que o princípio da proibição do excesso) (In
op. cit. Página 172) (grifos nossos).
Por
fim, cumpre notar que os princípios da ofensividade e da proporcionalidade,
amplamente difundidos pela doutrina pátria e alienígena e concretamente
reconhecidos pela jurisprudência – a par de não estarem previstos
expressamente no texto constitucional - são dele inferidos, como corolários do
Estado Democrático de Direito, onde desponta a dignidade da pessoa humana como
fundamento e que, em momento algum, pode ser abalada pelo uso desnecessário do
Direito Penal.
O
próprio princípio da legalidade – pedra angular do Direito Penal – dá
abrigo à ofensividade e à proporcionalidade, na medida em que não pode mais
ser visto em seu aspecto puramente formal, senão a partir de uma análise
substancial, em que a legalidade perpassa pelo terreno da legitimidade e se
submete a todo o arcabouço dos direitos fundamentais inseridos na Carta Política.
Recorrendo
novamente a Ferrajoli, é preciso que os operadores jurídicos abandonem o
iuspositivismo dogmático no qual se encontram encastelados, e que os torna reféns
das leis inválidas, para que – adotando postura mais crítica e comprometida
– passem a ser paladinos da Constituição e da justiça.
IV
– DO PEDIDO
Pelo
exposto, considerando inconstitucionalidade da norma contida no art. 10, §1º,
II, da Lei nº 9.437/97, na medida em que o legislador, ao cuidar da sua elaboração,
ignorou de forma clara, os princípios constitucionais da ofensividade e
proporcionalidade, o Ministério Público requer o ARQUIVAMENTO do Inquérito
Policial anexo, bem como seja, de imediato, relaxada a prisão de F. B. S.,
expedindo-se em seu favor o competente alvará de soltura, pois, não fossem os
vícios que maculam a peça flagrancial, a prisão se torna ilegal a partir das
razões de mérito aqui expendidas.
Por
derradeiro, o Ministério Público requer, sejam encaminhadas cópias do auto de
prisão em flagrante delito à Corregedoria Geral de Polícia Civil, para apurar
a responsabilidade administrativa dos policiais responsáveis pela prisão
ilegal aqui narrada (IPC Pedro Paulo Ferreira da Silva e IPC Bosco, ambos
lotados na DP do Aurá), solicitando que, ao final do procedimento, as peças,
em fotocópia, sejam enviadas ao Ministério Público de Ananindeua, para as
providências judiciais cabíveis.
E.
Deferimento.
Ananindeua,
19 de junho de 2001.
Ana
Cláudia Bastos de Pinho
Promotora de Justiça
IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - Rua Onze de Agosto, 52 - 2º Andar - Centro - São Paulo - SP - 01018-010 - (11) 3111-1040