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Decisões: Processo penal. ROC. Interposição no STF. Impossibilidade.

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STF RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS Nº 82.088-3 (DJU 07.08.02, SEÇÃO 1, P. 35, J. 01.08.02) PROCED.: MINAS GERAIS
RELATOR:
MIN. CELSO DE MELLO
RECTE. :
I.C.F.
RECTE. :
L.F.F.
RECTE. :
M.A.F.
ADVDOS.:
ALECIO MOREIRA DE SOUSA JUNIOR E OUTRA
RECDO. :
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DECISÃO: O presente recurso ordinário, interposto contra decisão denegatória de habeas corpus, revela-se insuscetível de conhecimento. É que a parte ora recorrente - embora devesse formalizar a petição recursal perante o Tribunal que proferiu o acórdão impugnado (o Superior Tribunal de Justiça, no caso) - optou por solução errônea e heterodoxa, claramente desautorizada pelo ordenamento positivo, eis que deduziu, diretamente perante o próprio Supremo Tribunal Federal (juízo ad quem), o recurso ordinário em questão. Esse comportamento processual da parte ora recorrente evidencia uma frontal transgressão à disciplina normativa que emerge do sistema recursal consagrado em nosso direito. Cumpre não perder de perspectiva, neste ponto, a observação, feita pelo magistério da doutrina (NELSON NERY JUNIOR, "Princípios Fundamentais - Teoria Geral dos Recursos", p. 48, 1990, RT), no sentido de que o ordenamento positivo brasileiro , com a só exceção das hipóteses expressamente previstas em lei "estabelece que o reL'urso é interposto perante o mesmo órgão jurisdicional que proferiu a decisão impugnada. O reL'urso será processado no juízo a quo, que, oportunamente, o remeterá ao órgão destinatário competente para o julgamento do recurso". Esse mesmo entendimento é perfilhado por FERNANDO CAPEZ ("Curso de Processo Penal", p. 506, 7ª ed., 2001, Saraiva), cuja lição, na matéria, assinala a necessidade de observar-se, mesmo em sede processual penal, a disciplina ritual.que atribui, de modo insuprimível, ao juízo a quo, a competência para exercer, no que se refere ao recurso ordinário em habeas corpus, o respectivo controle de admissibilidade, o que significa, portanto, não se revelar processualmente lícita a direta interposição, perante o próprio órgão judiciário ad quem, da espécie recursal em questão. É preciso ter presente, bem por isso, que o recurso ordinário em habeas corpus "será interposto no prazo de cinco dias, nos próprios autos em que se houver proferido a decisão recorrida, com as razões do pedido de reforma" (RISTF, art. 31 - grifei). Essa norma regimental - que, por revestir-se de índole processual, foi recebida, pela nova Constituição da República, com força e eficácia de lei -, ao definir o órgão judiciário junto ao qual deve instaurar-se o procedimento recursal, impede que a parte recorrente, agindo per saltum, interponha o recurso ordinário em habeas corpus, desde logo e diretamente, perante o Supremo Tribunal Federal. Os sujeitos da relação processual não têm qualquer poder de disposição sobre as regras definidoras do iter referente ao procedimento recursal, Isso significa, portanto, que se revela insuprimível, na esfera do procedimento recursal, a fase preliminar em cujo âmbito assiste, à Presidência do Tribunal a quo, o exercício do controle de admissibilidade pertinente ao recurso de índole penal (VICENTE GRECO FILHO, "Manual de Processo Penar", p. 351/352, item n. 73.2, 6ª ed., 1999, Saraiva), tal como sucede em relação ao recurso ordinário deduzido em face de decisão denegatória de habeas corpus. É por essa razão que ADA PELLEGRINI GRINOVER, ANTONIOMAGALHAES GOMES FILHO e ANTONIO SCARANCE FERNANDES ("Recursos no Processo Penal", p. 69, item n. 34, 1996, RT) acentuam que, "Em princípio. a competência para o primeiro juízo de admissibilidade é do próprio órgão perante o qual se interpõe o recurso" (grifei). Daí o irrepreensível magistério de JOSÉ FREDERICO MARQUES ("Elementos de Direito Processual Penal", vol, IV/222-223, item n, 1.042, 2ª ed., atualizada por Eduardo Reate Ferrari, 2000, Millennium), cuja lição, ao versar o tema do procedimento recursal, em sede de persecução penal, confirma o entendimento ora exposto na presente decisão: "O procedimento recursal tem início no juízo a quo, e prolonga-se no juízo ad quem, onde é julgado e ,se encerra. Com isso, há, também, uma divisão de competência funcional, dentro das vias recursais, entre o juízo a quo e o juízo ad quem, no tocante à prática de atos processuais. Como bem assinalou Enrico Tullio Liebman, 'no Direito brasileiro, interpõem-se os recursos perante o juiz a quo. Destarte, o processo do recurso apresenta sempre uma primeira fase que se desenvolve perante o juiz a quo e que termina com a ordem do juiz de remessa dos autos à ,superior instância." (grifei) Sendo positivo esse juízo de admissibilidade, o recurso ordinário será, então -e somente então - remetido ao Tribunal ad quem (ao Supremo Tribunal Federal, no caso), sem prejuízo, em tal hipótese, de esta Corte examinar, em sua integralidade, os requisitos de admissibilidade da modalidade recursal em questão. O que não se justifica é a opção feita pelos ora recorrentes - opção esta que não encontra qualquer apoio no sistema jurídico em vigor -, consistente na interposição d recurso ordinário, diretamente, perante o Supremo Tribunal Federal. Bem por isso, a jurisprudência esta Suprema Corte firmou entendimento no sentido de que se revela insuscetível de conhecimento o recurso ordinário, que, como na espécie destes autos, tenha sido interposto, diretamente, junto ao Tribunal ad quem (HC 58.349-RJ, Rel. Min. MOREIRA ALVES: "Recurso ordinário de habeas corpus interposto diretamente ao Supremo Tribunal Federal e não nos próprios autos em que foi proferida a V. decisão recorrida (...). HC não conhecido." (HC 58.287-RJ, Rel. Min. CORDEIRO GUERRA - grifei) Vê-se, desse modo, em tema recursal considerada a divisão de competência funcional existente entre os órgãos do juízo a quo e aqueles que se situam no juízo ad quem - que não se revelava lícito, à parte recorre te, agir da maneira como o fez, devendo, por isso mesmo, expor-se às conseqüências jurídicas de sua conduta processualmente inadequada. Sendo assim, tendo em consideração as razões expostas, não conheço do presente recurso ordinário em habeas corpus, restando prejudicada, em conseqüência, a apreciação do pedido de medida liminar. Arquivem-se os presentes autos. Publiquem-se Brasília, 1º de agosto de 2002. Ministro CELSO DE MELLO
Relator


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