INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

     OK
alterar meus dados         
ASSOCIE-SE

Artigos

Decisão: Admissão do agravo de instrumento no caso de dúvida quanto ao recurso contra decisão interlocutória

As opiniões expressas nos artigos publicados responsabilizam apenas seus autores e não representam, necessariamente, a opinião deste Instituto

Juiz Élcio Pinheiro de Castro

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2001.04.01.036332-8/RS RELATOR: DES. FEDERAL ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO. MATÉRIA PENAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. ART. 129, CPP. SEQÜESTRO DE BENS. CABIMENTO. FUNGIBILIDADE. AMPLA DEFESA. CAUÇÃO. IDONEIDADE. FIANÇA. ART. 827, CPC. HIPÓTESES.
1. Havendo dúvida plausível quanto ao recurso adequado contra decisão interlocutória proferida nos embargos de terceiro indeferindo o levantamento liminar do seqüestro de bens realizado em procedimento criminal, admite-se excepcionalmente o agravo de instrumento, por analogia ao processo civil, em atenção ao princípio constitucional da ampla defesa.
2. A caução de que trata o art. 131, II do Diploma Processual Penal pode ser prestada através de qualquer das modalidades previstas no art. 827 do CPC, não havendo obrigatoriedade do depósito em dinheiro, desde que a medida seja suficiente para assegurar a aplicação da lei.
3. No caso, revela-se adequada a apresentação de fiança bancária a título de garantia. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos entre as partes acima indicadas, decide a Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, restando prejudicado o exame do agravo regimental, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 01 de outubro de 2001. JUIZ ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO: - Cuida-se de agravo de instrumento interposto por J.R.B. contra decisão do eminente Juiz Federal Substituto da 3ª Vara Criminal de Porto Alegre. Registra o Agravante que ajuizou embargos de terceiro, nos termos do art. 129 do Código de Processo Penal, contra seqüestro de bens decretado nos autos da Ação Penal nº 2000.71.00.037970-4 em que figura como réu M.R., por ser atual proprietário de um automóvel Honda Civic abrangido pela guerreada medida assecuratória. O julgador a quo indeferiu o levantamento da restrição, mediante fiança a ser prestada pelo Requerente e sua esposa, entendendo que a caução estatuída no art. 131, inc. II, do Diploma Processual Penal deve ser prestada em dinheiro. Contra esse decisum foi interposto o presente agravo. Argumenta o Postulante que descabe ao juiz determinar a modalidade de garantia a ser prestada, porquanto “a escolha da caução pertence ao caucionante; só este pode saber da sua disponibilidade”, aplicando-se ao caso dos autos o disposto no art. 827 do Código de Processo Civil. Assevera ser a fiança espécie de caução apta a assegurar o levantamento do guerreado seqüestro. Oficiando no feito, o douto Representante do Ministério Público opinou pelo improvimento do agravo (fls. 48/49). Proferi decisão negando seguimento ao recurso, por manifestamente inadmissível. Sobreveio agravo regimental, onde sustenta o Recorrente, em síntese, ter o decisum proferido nos embargos de terceiro caráter interlocutório, desafiando o recurso estabelecido na lei civil, por inexistir previsão específica no Estatuto Penal Adjetivo. Postula aplicação do princípio da fungibilidade, assegurando-se o direito à ampla defesa, ante a dúvida existente sobre qual o meio processual cabível para veicular a irresignação formulada na hipótese sub judice. É o relatório. VOTO JUIZ ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO: - Preliminarmente, cumpre analisar a questão do cabimento ou não da via recursal eleita. A decisão objeto do regimental foi lavrada nas seguintes letras: “Cuida-se de agravo de instrumento interposto contra decisão proferida pelo MM. Juiz da 3ª Vara Federal de Porto Alegre que, nos autos do Procedimento Criminal nº 2000.71.00.041646-4, indeferiu pedido de liberação, mediante fiança, de seqüestro prévio incidente sobre determinado veículo, condicionando o término da mencionada constrição ao depósito em dinheiro do valor atribuído ao referido bem. Pleiteia o Agravante, em síntese, que seja reconhecido o direito de levantar a restrição judicial mediante caução fidejussória. Contudo, a via escolhida para manifestar tal irresignação é manifestamente inadequada. Com efeito, a possibilidade da interposição de agravo, em matéria criminal, está restrita às hipóteses de negativa de seguimento a recurso para os Tribunais Superiores (art. 28 da Lei nº 8.038/90) e ao agravo em execução penal, nos termos do artigo 197 da Lei nº 7.210/84. Para as decisões proferidas em ações penais ou em procedimentos criminais diversos, o recurso cabível, consoante previsto na legislação penal adjetiva, pode ser o de apelação ou recurso em sentido estrito. Não havendo previsão legal, admite-se a interposição de habeas-corpus, correição parcial, ou mesmo mandado de segurança, conforme o caso. Na espécie sub judice, portanto, o pedido formulado não merece acolhida. Sequer poderia aplicar-se o princípio da fungibilidade recursal, por tratar-se de erro grosseiro, inviabilizando o aproveitamento da súplica. Frente a esse quadro, nego seguimento ao presente agravo, com apoio no art. 557 do CPC, c/c art. 37, § 1º, inc. II, do Regimento Interno desta Corte, por manifestamente inadmissível. Intimem-se. Após, remetam-se os autos à Vara de origem”. Em princípio, não se vislumbra motivos para alterar o decisum supratranscrito. Na realidade, até que ocorra mudança na legislação processual penal, o recurso de agravo só é cabível nos casos de negativa de seguimento a apelos especial ou extraordinário e à fase de execução. Contudo, em atendimento ao princípio da ampla defesa consagrado na Carta Magna; considerando a restrição quanto à admissibilidade do mandado de segurança em matéria criminal, por ser remédio constitucional de aplicabilidade limitada, bem como o fato de haver ponto omisso no Estatuto Penal Adjetivo quanto ao recurso correto da decisão que indefere liminar em embargos de terceiro, penso que se pode empregar, analogicamente, o agravo de instrumento, com apoio no art. 3º do CPP, de modo a não restar sacrificado o possível direito da parte. Nessa linha de entendimento, proferiu brilhante voto o ilustre Desembargador Volkmer de Castilho nos autos do Mandado de Segurança nº 2001.04.01.040704-6/PR (julgado em 23.08.2001), de cujo teor permito-me transcrever um trecho, com a vênia do nobre colega: “Ora, havendo processo judicial e não sendo permitida a privação de bens sem o devido processo legal (art. 5º, LIV, CF) o qual contém o direito ao recurso, parece forçoso ter que, no processo de seqüestro – incidente ou prévio à ação penal, das decisões do julgador que incorram na hipótese constitucional há de haver recurso. Assim, se o Código de Processo Penal não o prevê expressamente, cabe a colmatação da lacuna pela aplicação analógica da legislação processual civil. De qualquer modo, consoante o disposto no art. 129 do CPP (‘o seqüestro autuar-se-á em apartado e admitirá embargos de terceiro’) o legislador está a indicar que é dos embargos de terceiro disciplinados no CPC (art. 1016 e seguintes) a que ele se refere, como, de resto, o faz certo o contido no art. 139 do CPP e, então, há de se fazer valer o recurso cível apropriado...” Frente a esse quadro, como na espécie sub judice o recurso cível apropriado é o agravo de instrumento, embora a decisão hostilizada tenha sido proferida por magistrado oficiante em Juízo criminal, impõe-se admitir o processamento da irresignação. Superada a prefacial, cinge-se a controvérsia acerca do tipo de caução a ser prestada para autorizar-se o levantamento liminar do seqüestro nos embargos de terceiro, levando em conta que estes só poderão ser decididos definitivamente após o trânsito em julgado da sentença condenatória (art. 130, parágrafo único, CPP). A propósito, veja-se o que está escrito no art. 131, inciso II do Diploma Processual: O seqüestro será levantado: se o terceiro, a quem tiverem sido transferidos os bens, prestar caução que assegure a aplicação do disposto no art. 74, II , b, segunda parte, do Código Penal (atual artigo 91, II, b, do CP). O dispositivo referido (artigo 91, II, b), por sua vez, dispõe que: “São efeitos da condenação (...) a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé: do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.” Portanto, da conjugação desses preceitos, verifica-se que a caução só pode ser deferida quando for realmente eficaz para assegurar a reversão em favor da União de valor igual ao do bem seqüestrado, na hipótese de restar prolatada sentença condenatória. Isso não significa, necessariamente, que a garantia deverá ser prestada em dinheiro, como entendeu o ilustre julgador monocrático, bastando, como visto, que seja apta a surtir o efeito previsto na norma. Buscando auxílio, mais uma vez, na legislação processual civil, insta consignar o disposto no art. 827, do CPC, que trata justamente das modalidades de caução, in verbis: “Quando a lei não determinar a espécie de caução, esta poderá ser prestada mediante depósito em dinheiro, papéis de crédito, títulos da União ou dos Estados, pedras e metais preciosos, hipoteca, penhor e fiança.” Destarte, indiscutível a possibilidade, em tese, de ser prestada caução fidejussória objetivando o levantamento do seqüestro nos embargos de terceiro, não havendo obrigatoriedade do depósito em dinheiro. Resta saber, por outro lado, se a fiança ofertada pelo Requerente é ou não satisfatória para assegurar à União a restituição do valor do automóvel no caso de improcedência dos embargos. A despeito da argumentação deduzida no recurso, penso que, no ponto, a razão está com o ilustre agente ministerial quando assevera, em seu parecer, que o juiz deve zelar pela efetividade da medida constritiva, garantindo a aplicação de eventual pena de perdimento, nos termos da lei. De fato, o compromisso pessoal do Postulante e seu cônjuge, por mais credibilidade que tenham, não se presta como garantia, pois não há quem abone sua solvência. A caução deve vir amparada em objeto palpável ou direito real, a tal não se equiparando a fiança conjunta com a esposa, porquanto, como parece evidente, o casal não pode ser fiador de si mesmo. De outra sorte, se for apresentada como fiadora instituição financeira, inexiste óbice ao deferimento do pedido. Concludentemente, embora não seja correto exigir o depósito em dinheiro no valor do bem, eis que a medida comporta qualquer das modalidades estabelecidas no art. 827 do CPC, tampouco se mostra aceitável a hipótese de fiança pessoal pretendida, por ineficácia absoluta desta obrigação de atingir o efeito colimado. Assim, revela-se adequada na hipótese em exame a prestação de fiança bancária, com o que fica atendida a garantia do juízo. Ante o exposto, conheço do recurso e lhe dou parcial provimento para oportunizar ao Agravante o oferecimento de fiança bancária, restando prejudicado o exame do agravo regimental.


Seja o primeiro a comentar esta notícia, clique aqui e deixe seu comentário


  


IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - Rua Onze de Agosto, 52 - 2º Andar - Centro - São Paulo - SP - 01018-010 - (11) 3111-1040