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Decisão: Habeas corpus. Ausência do requisito subjetivo para a concessão da suspensão condicional do processo, do artigo 89 da Lei 9.0099/95. Writ indeferido.
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Des. Fed. Élcio Pinheiro de Castro
HABEAS CORPUS Nº 2001.04.01.071297-9/PR
RELATOR: DES. FEDERAL ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO
EMENTA
HABEAS CORPUS. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. ART. 89 DA LEI Nº 9.099/95. NÃO-OFERECIMENTO. AUSÊNCIA DO REQUISITO SUBJETIVO. CULPABILIDADE.
1. Hipótese em que é incabível a proposta de suspensão condicional do processo ao paciente, eis que ausente o requisito subjetivo. 2. A culpabilidade mostra-se exacerbada, pois o denunciado é Policial Rodoviário Federal e foi surpreendido em flagrante delito cometendo o crime previsto no art. 334 do Código Penal, quando deveria reprimi-lo. Assim, é grande a reprovabilidade de sua conduta. 3. Habeas corpus indeferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos entre as partes acima indicadas, decide a Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, denegar a ordem, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 08 de outubro de 2001.
JUIZ ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO: - Trata-se de habeas corpus, com pretensão liminar, impetrado por E.R.G., em favor de A.A.Z., contra ato do MM. Juiz da 2ª Vara Federal Criminal de Foz do Iguaçu que, nos autos da ação penal nº 2000.70.02.000681-2, acatando manifestação do Ministério Público, indeferiu pedido de suspensão condicional do processo, nos termos preconizados pelo artigo 89 da Lei nº 9.099/95.
Consoante se depreende dos autos, o paciente foi denunciado como incurso nas sanções do artigo 334, caput, do Código Penal, por ter sido preso em flagrante, na companhia do co-réu I.J.S., em 22.02.2000, conduzindo, pela BR 277 - trecho próximo à localidade de Santa Terezinha de Itaipu/PR - veículo Tempra contendo cigarros de procedência estrangeira introduzidos ilegalmente em território nacional.
Ao oferecer a peça acusatória, o Parquet Federal deixou de propor o sursis processual, pelo fato de não preencher o acusado os requisitos subjetivos elencados no artigo 89, caput, da Lei nº 9.099/95, principalmente quanto à culpabilidade, em virtude de exercer cargo de Policial Rodoviário Federal (fls. 23-4). Adotando esses fundamentos, a ilustre autoridade impetrada indeferiu o pedido formulado pela defesa (fl. 85), razão pela qual foi ajuizado o presente mandamus.
Sustenta o impetrante, em suma, estar o paciente sofrendo constrangimento ilegal, porquanto preenche os requisitos legais, aduzindo que o fato de ser funcionário público federal não constitui impedimento à concessão do benefício pleiteado. Consigna, ainda, que “a suspensão do processo é um direito subjetivo do réu, tendo o Ministério Público o poder-dever de propô-lo, caso estejam presentes os pressupostos que a autorizam, e havendo recusa ou inércia do ‘Parquet’, deverá o Magistrado concedê-la, após ser manifestado pelo réu o interesse no benefício” .
Indeferida a medida liminar (fl. 363).
A autoridade coatora prestou informações às fls. 365/367.
Oficiando no feito, a douta Procuradoria da República manifestou-se pela denegação da ordem.
É o relatório.
VOTO
JUIZ ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO: - A decisão que indeferiu a medida de urgência praticamente esgotou o exame da questão sub judice, razão pela qual, para evitar desnecessária tautologia, tomo a liberdade de reproduzir seu conteúdo:
“Inicialmente, antes de examinar a questão debatida, mister referir que embora esta Corte já tenha manifestado entendimento no sentido de que “da decisão que concede ou nega a suspensão do processo prevista no art. 89 da Lei nº 9.099/95, é cabível a interposição de recurso em sentido estrito, por aplicação analógica do art. 581, XI, do CPP, que prevê esse recurso contra decisão que conceder, negar ou revogar a suspensão condicional da pena” (ACr nº 1999.04.01.006711-1, 1ª Turma, Rel. Juíza Ellen Gracie Northfleet, DJU de 15.03.2000, p. 29), não vejo óbice algum para o conhecimento da presente ação constitucional, visto ser indubitável que, por sua tramitação rápida e célere, é um dos meios mais eficazes para se afastar, de pronto, possível constrangimento ilegal, mormente quando o recurso cabível, em tese, contra a decisão guerreada não é dotado de efeito suspensivo. No mérito, não se vislumbra, em princípio, flagrante ilegalidade a justificar o deferimento da medida de urgência. É cediço que, para concessão do sursis processual, além dos pressupostos objetivos (pena mínima cominada igual ou inferior a um ano e não estar o acusado respondendo outro processo-crime), o artigo 89 da Lei nº 9.099/95 expressamente exige que estejam “presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal)”, ou seja, que “a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício”. Ensina Júlio Fabbrini Mirabete (in Juizados Especiais Criminais, Ed. Atlas, 3ª edição, p. 163, “que só poderá ser proposta e homologada a suspensão condicional do processo quando tais circunstâncias forem totalmente favoráveis ao acusado”, o que, a priori, não se verifica na espécie, consoante pode ser observado na manifestação ministerial exarada nas seguintes letras: ‘Incabível, in casu, a suspensão condicional do processo aos denunciados. A culpabilidade do ato praticado pelos denunciados ultrapassa os limites da normalidade em casos do gênero. Na realidade, constitui fato inaceitável, inadmissível, que um Policial Rodoviário Federal, que tem entre as suas atribuições reprimir o ilícito de contrabando/descaminho, venha a associar-se com terceiro para praticar justamente o delito do artigo 334 do Código Penal Brasileiro. Urge que elementos desta índole sejam extirpados do setor público, vez que com condutas desta natureza, calcadas na certeza da impunidade pelo uso da carteira funcional ao longo da BR-277, trazem reflexos negativos inclusive sobre toda a corporação de Policiais Rodoviários Federais, que, certamente, é composta, em sua grande maioria por pessoas honestas (...).’ (fls. 23-4). De fato, é patente o alto grau de reprovabilidade na conduta perpetrada pelo acusado, pois se mostra inconcebível que agentes públicos justamente incumbidos de fiscalizar e evitar atividades ilícitas, venham a praticar condutas criminosas, especialmente contrabando/descaminho, cuja repressão a esse delito é obrigação inerente ao cargo ocupado pelo réu (Policial Rodoviário Federal), razão pela qual, além da falta dos requisitos sujetivos elencados na lei, o sursis processual não se afigura, na espécie, medida suficiente como retribuição penal, tampouco adequada para a prevenção, geral e especial, ao delito. Nesse sentido: ‘PROCESSUAL PENAL. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. ARTIGO 89 DA LEI Nº 9.099/95. PROPOSTA. COMPETÊNCIA. MINISTÉRIO PÚBLICO. REQUISITOS SUBJETIVOS. ARTIGO 77 DO CÓDIGO PENAL. I – A competência exclusiva conferida ao Ministério Público pelo artigo 89 da Lei nº 9.099/95 para oferecer a proposta de suspensão condicional do processo não pode ser subtraída nem suprimida pela autoridade judiciária frente a recusa fundamentada do Promotor de Justiça. II – O moderno instituto da suspensão condicional do processo exige a presença dos requisitos subjetivos inscritos no artigo 77 do Código Penal, para a concessão da suspensão condicional da pena. III – Recurso ordinário improvido.’ (STJ, Sexta Turma, Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 7887/SP, Rel. Min. Vicente Leal, DJU de 21.06.99, p. 202). Ante o exposto, indefiro a liminar.”
Em síntese, na hipótese dos autos, é incabível a proposta de suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei nº 9.099/95) ao paciente, eis que ausente o requisito subjetivo. A culpabilidade mostra-se exacerbada, pois o denunciado é Policial Rodoviário Federal e foi surpreendido em flagrante delito cometendo o crime previsto no art. 334 do CP, quando deveria reprimir o ilícito do contrabando/descaminho. Assim, grande a reprovabilidade de sua conduta.
Nesse sentido, como bem mencionou a ilustre autoridade coatora:
“Ora, a culpabilidade é, em resumo, um juízo de reprovação do agente, sendo seus elementos a imputabilidade, a consciência potencial da ilicitude e a inexigibilidade de conduta diversa. Nesse passo, não se pode desprezar o fato de que o réu é policial rodoviário federal, que ressai aos olhos da sociedade como ‘autoridade’, sendo braço ostensivo da lei e da ordem, pelo que tem ciência acima da média acerca da ilicitude de sua conduta, e lhe é exigível um comportamento mais regrado; em suma, a reprovação da conduta do réu, pela sua condição pessoal, deve ser maior da que se aplicaria, por exemplo, a uma pessoa comum, (...)” (fl. 367).
Ante o exposto, denego a ordem.
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