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Decisões: Crime de imprensa. Notificação para a não destruição do texto ou gravação. Art. 58, parágrafo 3º, da Lei de Imprensa. Impossibilidade. Min. Sepúlveda Pertence

As opiniões expressas nos artigos publicados responsabilizam apenas seus autores e não representam, necessariamente, a opinião deste Instituto

STF - INQUÉRITO N. 1.665-9 (DJU 31.10.2000, p. 37) 

 

PROCED. : MATO GROSSO  

RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE  

QTE.        : DARCY CAPISTRANO DE OLIVEIRA FILHO 

ADVDOS.: HERNAN ESCUDERO GUTIERREZ E OUTRA  

QDO.       : GILMAR FERREIRA MENDES

 


DESPACHO : Cuida-se de queixa oferecida por Darcy Capistrano - então candidato a Prefeito de Diamantina-MT, contra Gilmar Ferreira Mendes, Advogado-Geral da União, a quem imputa a prática, em entrevista à televisão, dos crimes de difamação e injúria.

 

A queixa - além de atribuir ao querelado a intervenção indevida e com abuso de poder na campanha eleitoral em que o querelante disputava o mandato do Prefeito com o irmão do Advogado-Geral - a este especificamente imputa, a título de crimes de imprensa:

 

\"...com a nítida intenção de ofender a honra do ora queixoso, além de obter lucros políticos, com fins eleitoreiros, cuja entrevista concedida levada diretamente ao ar, em data de 14.09.00, período matutino, repetindo-se em outras programações do mesmo veículo de Comunicação Mato-grossense ora em voga, oportunidade em que utilizou, ao se dirigir de viva voz e imagem, à pessoa do querelante, termos e palavras de cunho altamente ofensivo à honra, especialmente, quando afirmou: que era este do:

 

\"...NARCOTRÁFICO...\", \"...AGIOTA...\", \"IMPRESTÁVEL PARA RETORNAR AO PAÇO MUNICIPAL LOCAL, ... MALVERSADOR DO ERÁRIO PÚBLICO...\", (sic) enfim, palavras de ordem e de desafio a qualquer cidadão Diamantinense, que reside, vive, convive o dia a dia com o ora querelante, que trabalha diuturnamente na região, que sabe que o ora querelante nada deve em seu caráter, como Pai, como Político, bem como para com a Justiça Criminal ou Cível, o que é diferente para com o ilustre cidadão Diamantinense, que sempre esteve fora de sua terra natal e nada sabe da vida pessoal e profissional do ora querelante.\"

 

A inicial da ação penal privada traz cópia deste pedido endereçado ao Diretor de Jornalismo da TV-Gazeta, Canal 10, pelo advogado da coligação que patrocinava a candidatura do querelante:

 

\"Hernan Escudero Gutierrez, Advogado da \"Coligação Reconstruir Diamantino\", vem perante v. Senhoria \"Solicitar\" 02 (duas) cópias de vídeo de reportagem levada ao Ar por esta Conceituada Rede de TV Matogrossense, no dia 14/09/00, período Matutino, do Sr. Ministro Chefe da Advocacia Geral da União, a fim de tomar medida judiciais cabíveis.\"

 

Ao pé da missiva, tem-se recibo do destinatário.

 

Apenso aos autos da queixa, tem-se envelope, que a acompanhou, contendo, segundo anotações manuscritas, uma \"fita de vídeo Sony\" e uma \"fita cassete\".

Diz-se na inicial:

 

\"Quanto à materialidade, não há o que se discutir, já que a prova apresentada com a presente, especialmente, a fita de vídeo, contém a gravação total e completa de ambas as entrevistas, concedidas pelo querelado, estando, portanto, devidamente materializados os crimes.

 

Aliás, observamos que, afora a prova apresentada da fita com gravação da(s) entrevista(s), a(s) qual(is) deverá(ão) ser submetida(s) a perícia, com as suas degravações, também, admite-se a demonstração da materialidade do crime, através de provas indiretas, estendendo-se também à fita-cassete.

Veja-se que, \"in casu\", até as chamadas provas indiretas são desnecessárias, uma vez que, em ambas as entrevistas, várias foram às vezes em que o entrevistado é interpretado pelo seu próprio nome, além do que, existe a sua imagem, bradando a viva voz, as suas assertivas altamente ofensivas.\"

 

Distribuído o feito ao Ministro Moreira Alves, S. Exa. declarou suspeição.

 

A mim redistribuído, despachei:

\"Ofereça o querelante, em dez dias, pena de indeferimento liminar da queixa, a prova da notificação exigida pelo art. 43 c/c arts. 57 e 58, § 3º, da Lei de Imprensa.\"

 

O despacho foi publicado no DJ de 03.10.00, certificando a Secretaria, de 13.10.00, que o querelante não se manifestou.

Decido.

 

Prescreve o art. 43 da Lei de Imprensa:

\"Art. 43. (...)

Se a infração penal tiver sido praticada através de radiofusão, a denúncia ou queixa será instruída com a notificação de que trata o art. 57.\"

 

A remissão dirige-se na verdade ao art. 58 no qual se lê:

\"Art. 58. As empresas permissionárias ou concessionárias de serviços de radiofusão deverão conservar em seus arquivos pelo prazo de 60 (sessenta) dias, e devidamente autenticados, os textos dos seus programas, inclusive noticiosos.

 

§ 1º Os programas de debates, entrevistas ou outros, que não correspondam a textos previamente escritos, deverão ser gravados e conservados pelo prazo, a contar da data da transmissão, de 20 (vinte) dias, no caso de permissionária ou concessionária de emissora de até 1 (um)kw, e de 30 (trinta) dias, nos demais casos.

 

(...)

§ 3º. Dentro dos prazos referidos neste artigo, o Ministério Público ou qualquer interessado poderá notificar a permissionária ou concessionária, judicial ou extrajudicialmente, para não destruir os textos ou gravações do programa que especificar. Neste caso, sua destruição dependerá de prévia autorização do juiz da ação que vier a ser proposta, ou, caso esta não seja proposta nos prazos de decadência estabelecidos na lei, pelo juiz criminal a que a permissionária ou concessionária pedir autorização.\"

 

Essa notificação prevista no art. 58, § 3º - destinada à preservação do corpo de delito - é ônus do titular da ação penal e constitui, conforme jurisprudência assente (cf. Silva Franco, Leis Penais Especiais e sua Interpretação Jurisprudencial, 6ª ed., v. 2/1733 ss.), condição de procedibilidade, cuja falta induz à rejeição da denúncia ou da queixa.

 

Ainda não corridos, quando do ajuizamento da queixa, o prazo de 30 dias do § 1º, in fine, do art. 58, da Lei de Imprensa, entendi cabível assinar ao querelante prazo para demonstrar a satisfação do ônus legal: contudo, intimado, não o fez.

 

Há julgados que entendem suprida a exigência legal da notificação à emissora se se junta gravação de autenticidade induvidosa, acompanhada de \"degravação\" efetivada por funcionário competente: não é o caso, porém.

 

Não substitui a notificação para que a emissora conserve o corpo de delito, a referida solicitação de cópias a ela dirigida pelo advogado, sobretudo quando sequer se preocupou o querelante de demonstrar que as gravações que instruem a inicial teriam provindo da empresa, nem de oferecer qualquer degravação delas.

 

Assim, à vista da cominação expressa no despacho que assinou prazo para que o querelante suprisse o vício da queixa, não há alternativa ao seu indeferimento liminar.

 

Diante do que, por outro lado, nem se faz necessário cominar ao autor outro prazo para que ofereça procuração ao signatário da queixa com a \"menção do fato criminoso\", exigida pelo art. 44 C.Pr.Penal, não suprida com a mera referência, no instrumento apresentado, aos nomina juris dos delitos imputados ao querelado.

 

De tudo, liminarmente indefiro a queixa .

 

Brasília, 24 de outubro de 2000.

 

Ministro Sepúlveda Pertence

Relator     



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