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APELAÇÃO
CRIME N°
70001997402
QUINTA
CÂMARA CRIMINAL PORTO ALEGRE
APELANTE:
P. R. D. R.
APELADO:
MINISTÉRIO PÚBLICO
-
Nulo é o processo em que o acusado é interrogado sem a presença de advogado
defensor.
-
Agressão aos princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV, da
Constituição Federal).
-
Nulidade decretada a partir, inclusive, do interrogatório.
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam
os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça
do Estado, à unanimidade, em decretar, de ofício, a nulidade do processo a
partir do interrogatório, inclusive.
Custas,
na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Desembargadores, Paulo Moacir Aguiar Vieira e Aramis Nassif.
Porto
Alegre, 14 de fevereiro de 2001.
Amilton
Bueno de Carvalho,
Relator.
Amilton Bueno de Carvalho (Relator) - O Ministério Público denunciou P.R.D.R., por incurso nas sanções do art. 155, caput, do Código Penal e J. R. L., por incursão nas penas do art. 180, caput, do mesmo diploma legal.
Narrou
a angular acusatória o seguinte fato delituoso:
"No
dia 13 de setembro de 1998, por volta das 12 horas, na estrada dos Alpes, 671,
nesta cidade, o denunciado Paulo Ricardo Dutra Rodrigues subtraiu, para si ou
para outrem, um televisor, marca Sharp, modelo 2053, colorida 20", de
propriedade de H. G. L.
Nas
mesmas condições de tempo, na Av. Divisa, s/nº, Vila Cruzeiro, nesta cidade,
o denunciado J.R.L., adquiriu, em proveito próprio ou alheio, o televisor acima
mencionado que sabia ser produto de crime.
Na
ocasião, após percorrer as ruas próximas, o denunciado Paulo Ricardo escolheu
a casa da vítima e, usando a porta dos fundos da residência, entrou e do seu
interior furtou o objeto já referido.
Ato
contínuo, P. R. D. R. procurou João Roni Lacerda, em sua casa e ofereceu-lhe o
televisor em troca de R$ 150,00 (cento e cinqüenta reais) em moeda corrente,
sendo tal preço aceito por Roni, que ficou com o televisor.
Foi
proposta a suspensão condicional ao acusado João Roni, a qual foi aceita,
sendo o processo cindido com relação ao mesmo
(fl. 37).
A
denúncia foi recebida em 16/08/99.
O
réu Paulo foi citado e interrogado, sem a presença de advogado (fl. 44). Veio
a defesa prévia (fl. 45).
Coletou-se
a prova oral (fls. 62/66).
As
partes nada requereram no prazo do artigo 499, do Código de Processo Penal.
Nas
alegações finais, o agente ministerial postulou a procedência da ação
penal, eis entendeu provadas materialidade e autoria. Por sua vez, o réu
requereu absolvição, com base no art. 386, III e VI, do Código de Processo
Penal.
O
ato decisório singular condenou o réu.
A pena privativa de liberdade teve base fixada em 01 ano e 06 meses de reclusão,
aumentada em 03 meses em face da agravante da reincidência, alcançando 01 ano
e 03 meses de reclusão, patamar que foi diminuído de 03 meses pela atenuante
da confissão espontânea, restando definitiva em 01 ano e 06 meses de reclusão,
em regime semi-aberto.
Estabeleceu-se,
ainda, pecuniária de 20 dias-multa, no valor mínimo.
Inconformado,
o réu apelou, requerendo absolvição com base no artigo 386, VI, do Código de
Processo Penal. Em contra-razões, o Ministério Público, postulou a manutenção
da decisão hostilizada.
Nesta
Instância, o Procurador de Justiça, Dr. Edgar Luiz de Magalhães Tweedie
manifestou-se pelo improvimento do apelo.
É o relatório.
VOTO
Amilton
Bueno de Carvalho (Relator)
- O feito - vênia do
colega singular - apresenta dúplice nulidade. Vejamos, pois.
A
primeira emerge do réu, ora apelante, ter sido interrogado sem a presença de
defensor.
A
matéria não é nova. Há antecedentes do antigo Tribunal de Alçada, lavra do
precioso Juiz Paulo Cláudio Tovo (Julgados 52-127, 53-99 e 54-146), optando
pela nulidade do feito ante o defeito. Em verdade, a tese foi derrotada.
De
logo, como suporte teórico, tenho que o processo penal - superada a
ingenuidade epistemológica de que ele busca a "verdade real" - é "un
conjunto de garantias fundamentales del ciudadano frente al arbítrio y el abuso
de la fuerza por parte del Estado" (Luigi Ferrajoli, Revista "Jueces para la
Democracia", nº 4, p.3, Madrid, 1998). Na mesma linha, ver Adauto Suannes,
"Fundamento Éticos do Devido Processo Penal", Revista dos Tribunais, 1999,
p. 139.
Assim,
o processo penal busca julgamento justo ao cidadão (outra vez, Adauto Suannes),
como instrumento de proteção ao cidadão frente ao Leviatã. É garantia do
acusado!
É
espetacular a importância do interrogatório no juízo penal: o acusado é
aquele que tem, como regra, o domínio integral do fato. Aliás, a instrução
- desde a inquisição - é dirigida basicamente a ele, com a busca da extração
- seja do modo que for - da "verdade máxima": a confissão.
A
importância é tamanha que o sistema impõe nulidade quando não se realiza,
estando presente o acusado (art. 564, III, "e", do Código de Processo
Penal).
A
natureza do ato tem dividido os pensadores do direito: para uns é meio de
prova, para outros meio de defesa.
Todavia,
numa ou noutra hipótese, é indispensável a presença de advogado na celebração
do ato mais importante da instrução criminal.
Se
meio de prova, não se admite a ausência porque só é prova aquela coletada
ante o crivo do contraditório (ver Afrânio Silva Jardim, "Direito Processual
Penal", 6ª ed., Forense, p. 209).
Não
se pode permitir, pois, que o momento probatório vital carregue a omissão do
contraditório - garantia processual fundamental na democracia.
Se
meio de defesa (o mais importante, pois dependendo de seu conteúdo, a atuação
da defesa técnica é inócua), a necessidade de presença de advogado ainda é
maior: como admitir defesa em processo criminal, ausente defensor?
E
há disposição constitucional expressa exigindo que "aos acusados em geral
serão assegurados o contraditório e ampla defesa, com meios e recursos a ela
inerentes" (art. 5º, LV).
A
omissão do Código, ao não exigir a presença de advogado no ato, não tem
significado algum frente a norma constitucional.
Em
tal contexto, tenho que o processo presente é nulo, a partir do interrogatório,
inclusive: agrediu a Constituição Federal - princípios da ampla defesa e do
contraditório!
Finalmente,
outra nulidade há. É que o apelante levantou, em defesa direta, a excludente
do estado de necessidade. A tese foi reiterada em alegações finais.
Todavia,
o ilustre colega singular não apreciou a referida tese. Outra vez, agredido o
princípio da ampla defesa.
Diante
do exposto, de ofício, decreta-se a nulidade do processo a partir do interrogatório,
inclusive.
Des.
Paulo Moacir Aguiar Vieira
- De acordo.
Decisor(a) de 1º Grau: Jose Ricardo Coutinho Silva.
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