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Decisões: Acórdão em sede de Recurso em sentido Estrito interposto pelo Ministério Público, no qual houve o reconhecimento do delito de bagatela

As opiniões expressas nos artigos publicados responsabilizam apenas seus autores e não representam, necessariamente, a opinião deste Instituto

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO : N° 70001362813

QUINTA CÂMARA CRIMINAL : TRAMANDAÍ

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO

RECORRIDO   : E. S. L.

EMENTA

"FURTO SIMPLES TENTADO. A INEXPRESSIVIDADE DO VALOR IMPÕE O RECONHECIMENTO DA BAGATELA. DENÚNCIA EXEMPLARMENTE REJEITADA NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO."

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso.

Custas, na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Desembargadores, Aramis Nassif e Luís Gonzaga da Silva Moura.

Porto Alegre, 13 de setembro de 2000. 

Amilton Bueno de Carvalho,

Relator.

RELATÓRIO

Amilton Bueno de Carvalho (Relator) - O Ministério Público, ofereceu denúncia contra E. S.L., por incurso nas sanções do art. 155, caput, combinado com art. 14, inciso II, ambos do Código Penal.

Narrou a angular acusatória o seguinte fato delituoso:

"No dia 04 de fevereiro de 2000, por volta das 21h00min, na Avenida Fernandes Bastos, nº1.527, interior do Supermercado Rissul, em Tramandaí, o denunciado E.S.L. tentou subtrair, para si próprio, um tubo de renovador de calçados marca nugget, quatro isqueiros marca Cricket pertencentes ao estabelecimento comercial acima referido, conforme auto de apreensão de fls., que foram avaliadas em R$ 8,55 (oito reais e cinqüenta e cinco centavos), conforme auto de avaliação de fls..o denunciado, não consumou o delito por circunstâncias alheias à sua vontade, visto que quando saía do estabelecimento comercial deixou as "res furtivae" caírem de dentro de seu moleton, onde estavam escondidas. Ato contínuo, foi preso em flagrante."

A peça acusatória autuada, foi rejeitada pelo juízo monocrático.

Irresignado com a decisão, o agente ministerial, interpôs, na forma do art. 581, I, do Código de Ritos Penais, o presente recurso em sentido estrito, pugnando pelo recebimento da exordial, pois entende não configurar o caso em tela hipótese de delito bagatelar, como sustenta o juízo singular.

Em contra-razões a defesa requereu o não provimento do recurso interposto.

Em despacho de sustentação a julgadora manteve a decisão.

Em Segundo Grau, a Procuradoria de Justiça, através do Dr. Lenio Luiz Streck, manifestou-se pelo improvimento do recurso:

"Com efeito, o fato narrado na exordial acusatória trata-se de clássico exemplo de crime de bagatela, não havendo, conforme bem fundamentado no despacho de rejeição da exordial, a tentativa de subtração perpetração não maculou/atingiu o bem jurídico protegido, não gerando justa causa a merecer perseguição penal."

É o relatório.

VOTO

Amilton Bueno de Carvalho (Relator) - A espécie, respeitosa vênia, causa espanto: movimentar a máquina cara, cansativa, burocrática, para buscar condenação por quase nada. Sequer a fúria persecutória pode justificar a presente ação penal.

O sistema deve ser racional - inexiste interesse na presente demanda!

Bem, exemplarmente bem, andou a ilustre colega Cristiane Stefanello Scherer ao abortar a inicial de acusação. Sua fundamentação, por exemplar, é adotada como razão de decidir:

"Máxima vênia, tenho que não há justa causa para a denúncia proposta pelo delito de furto tentado.

O processo instaurado contra E. S. L. menciona tentativa de furto ocasional, que se frustrou porque apanhado em posse da coisa furtada, ainda dentro do estabelecimento da vitima. A res furtiva foi avaliada em R$8,55(oito reais e cinqüenta e cinco centavos). À época do salário mínimo em R$ 136,00 (cento  e trinta e seis reais).

Tenho que se trata de fato bagatelar. Tem-se tentativa de furto de um tubo de renovador de calçados marca nugget e quatro isqueiros marca cricket, que foram restituídos à vítima, não podendo atingir o patrimônio de modo tão significativo que a máquina judiciária deva ser acionada, com todas as despesas e energias daí desperdiçadas.

No presente caso, só as diligências que serão necessárias com a expedição de precatória  para interrogatório do réu, superará, em muito, em numerário e energia processual, o valor do bem, que o réu sequer logrou subtrair. (in RSE 698 543 386, 8ª. Câmara Criminal, Rel. Tupinambá Pinto de Azevedo, julgado em 31.03.99).

"RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA SOCIAL DO FATO.

A tentativa de subtração de uma rede de dormir, de valor inferior a metade do salário mínimo, caracteriza fato bagatelar. Atipicidade do fato, por não atingido o bem jurídico protegido. Trancamento da ação penal.

CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS, DE OFÍCIO, PREJUDICADO O EXAME DO RECURSO." (SER 698 543 386, 8ª. Câmara Criminal, rel. Tupinambá Pinto de Azevedo, julg. em 31.03.99).

Assim, inatingindo o bem jurídico protegido, o fato revela-se atípico, por ausência de justa causa.

Ainda, como bem sustentado pelo colega Mauro Borba, nos autos do processo n. 47912:

"Em outros casos, parte-se até mesmo para soluções descriminalizadoras, onde se enquadra a questão  da criminalidade bagatelar.

"O mote para tal tendência, é um juízo de relevância da infração.

"A idéia que perpassa esse imaginário, é a de que só há crime na conduta ofensiva a bens jurídicos socialmente relevantes.

"Quando a conduta do agente, reproduzindo a descrição contida no tipo, não afeta, não atinge, nem ameaça o bem jurídico protegido, quando o agir se reveste de nenhuma, ou inexpressiva potencialidade de dano social (quando a conduta atinge valores desprezíveis a consciência coletiva), inexiste adequação típica.

Aliás, neste sentido já se manifestou a egrégia Corte de Justiça Gaúcha:

"FURTO. PEQUENO VALOR DA RES. IRRELEVÂNCIA SOCIAL DO FATO. CRIME DE BAGATELA. CONDUTA ATÍPICA. ABSOLVIÇÃO DECRETADA.

Apelo provido. Sentença reformada.

(Ap. Crim. N.296030976, 1ª. C. Crim. TARGS, rel. Marco Antônio Ribeiro de Oliveira, julg. 25.06.97).

"FURTO SIMPLES. BAGATELA.

Subtração de moeda correspondente a menos de 10% do salário mínimo, desafia a aplicação do princípio da insignificância. Absolvição decretada.

(Ap. Crim. N. 297014557, C. de Férias Crim., TARGS, rel. Amilton Bueno de Carvalho, julg.23.07.97).

"FURTO BAGATELA.

Subtração de coisa de valor insignificante é irrelevante ao direito penal. Absolvição decretada (Ap. Crim. 298001900, 5ª. C. Crim. TJRGS, rel. Amilton Bueno de Carvalho, julg. em 17.6.98).

"No mesmo sentido, também Ap. Crim. N. 297024101, 2ª. C. Crim. TARGS, rel. Tupinambá Pinto de Azevedo, julg. em 20.10.98)."

Como já dito, no caso concreto, o bem jurídico tutelado, o patrimônio da vítima não foi atingido. Trata-se de uma suposta tentativa de subtração de objetos no valor de R$ 8,55. Na medida em que não houve qualquer informação sobre a situação econômica da vítima, sabendo-se, apenas, tratar-se de Supermercado, dado necessário para a aferição da repercussão da subtração em seu patrimônio, com reflexos sobre o que sem tem por valor da coisa, tal circunstância não pode ser tomada em desfavor do acusado.

Assim, não vejo o preenchimento do tipo legal, não vislumbro crime."

Diante do exposto, nega-se provimento ao apelo.

DES. ARAMIS NASSIF - De acordo.

DES. LUÍS GONZAGA DA SILVA MOURA - De acordo.

Decisor(a) de 1º Grau: Cristiane Stefanello Scherer.



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