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STJ
- RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS Nº 10.549 - MG (DJU 18.06.01, SEÇÃO
1, p. 156)
RELATOR
: MINISTRO
JORGE SACARTEZZINI
RECORRENTE: N.G.S.
ADVOGADO : KLEBER
DO ESPIRITO SANTO E OUTRO
RECORRIDO
: TRIBUNAL
REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO
PACIENTE : E.A.F.
EMENTA
PROCESSO
PENAL - CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO - FATO TÍPICO - DENÚNCIA -INÉPCIA
-JUSTA CAUSA.
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O paciente obteve crédito rural para a aquisição de gado, no valor de
185.000,00 (cento e oitenta e cinco mil reais). No entanto, não adquiriu as
referidas reses, aplicando os recursos em finalidade diversa da prevista no
contrato. Esta conduta, em tese, é suficiente para caracterizar o delito
descrito no art. 20 da Lei na 7.492/86.
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Da cédula de crédito rural, anexada aos autos pelo Recorrente, consta como
objeto do financiamento a aquisição de gado bovino para produção de carne.
Desta forma, os recursos tinham que ser, necessariamente, aplicados nesta
finalidade. O argumento da defesa de que os recursos foram utilizados para a
engorda de gado já pertencente ao paciente, não é suficiente para afastar a
justa causa para a ação penal. Ressalte-se que o crédito agrícola, ou pecuário,
obtido por meio de financiamento, é vinculado ao fim determinado na própria cédula
rural, o qual, no presente caso, foi a obtenção de 925 cabeças de gado,
aquisição esta que não ocorreu. Diante disso, somente com a instrução
criminal é que se poderá provar a inocência do acusado.
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Também não se constitui em situação autorizadora do trancamento da ação
penal, o fato de o inquérito policial não ter se encerrado quando do
oferecimento da denúncia. Havendo indícios de autoria e materialidade do
delito, pode o Ministério Público apresentar a denúncia, independentemente de
inquérito. Nessa linha, encontra-se firme a jurisprudência pretoriana.
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A ausência ou não de justa causa para a ação penal é questão a ser
decidida após a instrução do feito. Somente quando a inexistência do fato ou
a inocência do acusado mostra-se evidentes, sem necessidade da ação nesta via
excepcional, o que, evidentemente, não é o caso.
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Assim, comprovada a materialidade do delito, qual seja, a não aquisição do
gado, e existindo indícios suficientes de que o paciente é o seu autor, impõe-se
o prosseguimento da ação penal a fim de que os fatos sejam devidamente
apurados, permitindo-se ao Ministério Público, como titular da ação penal, a
comprovação da veracidade da sua imputação.
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No tocante ao crime previsto no art. 19 da Lei n° 7.492/86, alega-se, no
presente recurso, que não se verificou a fraude, elemento constitutivo do tipo
penal, para a obtenção do crédito, não havendo o parquet demonstrado de que
maneira o paciente teria ludibriado o banco para a aquisição do financiamento.
Nesse particular, a irresignação procede.
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Com efeito, a peça vestibular aponta que o acusado agiu de má-fé por ocasião
da celebração do contrato de financiamento, mas não demonstrou em que
consistiria a fraude para a obtenção do financiamento. A peça vestibular não
logrou demonstrar, como deveria, o ardil utilizado pelo paciente para conseguir
a liberação do numerário.
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A má-fé do paciente, descrita na denúncia, exauriu-se na não aplicação dos
recursos aos fins estipulados na cédula rural, o que, na realidade, constituiu
o delito previsto no art. 20 do referido diploma legal .
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Para a caracterização do delito previsto no art. 19, seria que a fraude
ocorresse anteriormente à liberação do crédito, Justamente para que o
credor, induzido a erro, liberasse o financiamento. Esse ponto, portanto, a denúncia
não demonstrou.
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Por tais fundamentos, dou parcial provimento ao recurso para excluir da denúncia
o crime previsto no art. 19 da Lei 7.492/96, prosseguindo quanto ao delito
capitulado no art. 20 do Legal.
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