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Decisão: Processo Penal. Direito de apelar em liberdade. O Art. 594 do CPP é Constitucional.
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PROCED. : SÃO PAULO
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
PACTE. : D.A.
IMPTES. : J.C.D. E OUTROS
COATOR : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DECISÃO: O conteúdo do voto proferido pelo eminente Ministro HAMILTON CARVALHIDO. Relator do HC 21.802-SP, no E. Superior Tribunal de Justiça, parece descaracterizar a plausibilidade jurídica da pretensão deduzida pelos ilustres impetrantes.
Cabe registrar, neste ponto, que os fundamentos em que se apóia a presente impetração -notadamente aqueles que concernem (a) à ineficácia suspensiva dos recursos excepcionais (recurso extraordinário e recurso especial), analisada em face do princípio da não-culpabilidade, (b) à necessidade da efetiva implementação, no caso, da garantia de recorrer em liberdade (assegurada, ao ora paciente, pelo magistrado sentenciante de primeira instância), em oposição à suposta impossibilidade de antecipação cautelar da prisão do condenado, e (c) à nulidade do julgamento, por cerceamento de defesa decorrente da não-conversão, em diligência, desse mesmo julgamento - não têm o beneplácito da jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou em tais matérias.
Tenho para mim, em juízo de estrita delibação - e sem prejuízo de ulterior exame mais aprofundado das postulações em causa - que estas não parecem revestir-se de plausibilidade jurídica, especialmente se analisadas em face da jurisprudência prevalecente no Supremo Tribunal Federal.
A circunstância de ainda não haver transitado em julgado a condenação penal não impede seja efetivada, desde logo, a prisão do réu sentenciado, mesmo que este haja deduzido recursos de índole excepcional, como o são o recurso especial (para o Superior Tribunal de Justiça) e o recurso extraordinário (para o Supremo Tribunal Federal).
O Supremo Tribunal Federal, pronunciando-se a respeito nessa questão - e examinando-a em face da presunção constitucional de não-culpabilidade - tem enfatizado que a possibilidade de interposição dos recursos excepcionais não se qualifica como causa obstativa da imediata expedição do mandado de prisão contra o réu .sentenciado, ainda que a condenação penal, como no caso, não tenha transitado em julgado.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, após ampla discussão em torno dessa matéria, firmou-se no sentido de que "O direito de recorrer em liberdade não se estende ao recurso especial e ao recurso extraordinário, eis que essas modalidades excepcionais de impugnação recursal não se revestem de eficácia suspensiva" (RTJ 168/526-527, Rel. Min. CELSO DE MELLO - RTJ 169/271-274, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
Essa orientação jurisprudencial apóia-se no entendimento de que o postulado constitucional da não-culpabilidade do réu não se qualifica como obstáculo jurídico à imediata constrição do status libertatis do condenado (RTJ 138/762, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO - RTJ 142/856, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), ainda que se revele passível de impugnação, pela via do recurso especial (STJ) ou do recurso extraordinário (STF), o acórdão de Tribunal inferior que tenha veiculado condenação penal, inexistindo, sob esse aspecto, qualquer incompatibilidade com o princípio proclamado no art. 5°, LVII, da Carta Federal (HC 71.933-PB, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
Nem se alegue, de outro lado, que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) - já formalmente incorporada ao direito positivo interno do Brasil (Decreto n° 678/92) - impediria a privação antecipada da liberdade individual do réu ainda sujeito a decisão penal condenatória recorrível.
- O Plenário do Supremo Tribunal Federal, pronunciando-se sobre esse específico aspecto da questão, enfatizou que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos não assegura, de modo irrestrito, ao condenado, o direito de sempre recorrer em liberdade (RTJ 171/857, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA).
O eminente Ministro NÉRI DA SILVEIRA, Relator do precedente ora mencionado, assim se pronunciou, em seu voto vencedor, a respeito da matéria em referência (RTJ 171/866-867):
"Não vejo, pois, na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, invocada da tribuna, qualquer acréscimo nas garantias individuais e na proteção ao réu. A prisão do art. 594 do CPP não é inconciliável com a regra do art. 5°, LVII, da Constituição, conforme tem esta Corte proclamado. Não há ver, na Convenção em referência, regra de maior eficácia do que o sistema da Constituição, nem se pode entender que norma internacional faça inserir, em nosso ordenamento, preceito em conflito com a Constituição. Esta, como se acentuou consagra, também, o duplo grau de jurisdição, tal como na Convenção. Não vejo, a partir daí, por igual, haja a Convenção revogado a norma do art. 594 do CP" (grifei)
É certo que o Pacto de São José da Costa Rica, em tema de proteção ao status libertatis do réu, proclama que "Ninguém pode ser privado de sua liberdade física. salvo pelas causaS e nas condições previamente fixadas pelas Constituições políticas dos Estados-Partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas" (Artigo 7°, n° 2 - grifei).
Ocorre, no entanto, que essa cláusula da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ao remeter ao plano do direito positivo interno a definição normativa das hipóteses de supressão da liberdade pessoal, admite que o sistema jurídico nacional ou doméstico de cada Estado institua - como o faz o ordenamento estatal brasileiro -os casos em que se legitimará a privação antecipada do status libertatis do réu ou do condenado (RTJ 168/526527, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
Nada impede, portanto, consideradas as diretrizes consagradas em nosso sistema jurídico, que o réu condenado sofra, "ex ante", a privação cautelar de sua liberdade, especialmente quando esse ato excepcional consubstanciar-se, como no caso, em decisão penal condenatória, ainda que recorrível, pois, em tal hipótese, 'já existe um pronunciamento jurisdicional declarando provada a imputação", o que autoriza a asserção de que "A situação jurídica que se configura na sentença condenatória recorrível justifica muito mais a prisão que a própria sentença de pronúncia" (JOSÉ FREDERICO MARQUES, "Elementos de Direito Processual Penal", vol. IV/94, item n. 961, Ia ed./2a tir., 1998, Bookseller - grifei).
No caso, cumpre destacar que o acórdão emanado do E. TRF/3ª Região parece revestir-se de fundamentação idônea, apta, por si só, a atender, de modo mais que adequado, às exigências legais ínsitas às diversas modalidades de prisão provisória, notadamente se considerados, de um lado, a própria natureza do ato sentencial, e, de outro, os elementos que lhe dão suporte.
Sob tal aspecto, e tendo-se em vista a própria jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal, parece revestir-se de legitimidade jurídica a decisão, que, emanada do E. TRF/3ª Região, confirmou, em parte, a condenação penal imposta o ora paciente e ordenou a expedição, contra ele, de mandado de prisão, não obstante o reconhecimento, em seu favor, pelo magistrado sentenciante de primeiro grau, da possibilidade de o condenado recorrer em liberdade, o que se registrou, efetivamente, no caso ora em exame, em que o paciente, valendo-se dessa garantia, apelou, livremente, sem necessidade de recolher-se à prisão, exaurindo-se, no entanto, nesse ponto, a eficácia da garantia assegurada pelo ato sentencial proferido em primeira instância:
"Habeas cor pus. Direito assegurado à paciente de apelar em liberdade e assim permanecer até 'o trânsito em julgado de eventual apelação". 2. Art. 594, do Código de Processo Penal. Garantia de, tão-somente, apelar em liberdade. inexistência de conflito com o art. 5., inciso LVII. da Constituição. 3. De acordo com o § 2. do art. 27, da Lei nº 8.038/1990, os recursos extraordinário e especial são recebidos no efeito devolutivo. 4. Acórdão que, ao julgar a apelação, substituiu a decisão de primeiro grau, mantendo a condenação severa à pena restritiva de liberdade, embora minorando-a, e determinando, ainda, a expedição do mandado de prisão. 5. Mantida a sentença condenatória, contra a qual a ré apelara em liberdade, exauridas estão as instâncias ordinárias criminais, não sendo, assim, ilegal o mandado de prisão que órgão julgador de segundo grau determina se expeça. 6. Habeas corpus indeferido."
(RTJ 172/108, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA)
"1. A imediata expedição de mandado de prisão, em face da decisão proferida em sede de recurso de apelação não provido, não configura constrangimento ilegal, conforme jurisprudência desta Corte.
2. O recurso especial e o extraordinário, porque não possuem eficácia suspensiva do julgado, não obstam a execução provisória da decisão que condenou o paciente à pena de reclusão.
3. Habeas corpus indeferido."(HC 77.391-SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - grifei)
"JUIZ QUE CONDICIONA A EXPEDIÇÃO DE MANDADO DE PRISÃO AO - TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇAO PENAL.
-A deliberação do magistrado de primeira instância, que condiciona a expedição do mandado de prisão ao prévio trânsito em julgado da condenação penal, embora garanta ao réu o direito de apelar em liberdade contra a sentença, não vincula os Tribunais incumbidos de julgar os recursos ordinários ou extraordinários eventualmente deduzidos pelo sentenciado. O Tribunal ad quem, em conseqüência, pode ordenar; em sede recursal, a prisão do condenado, quando improvido o recurso por este interposto.
O acórdão do Tribunal ad quem - porque substitui a sentença recorrida no que tiver sido objeto de impugnação recursal - faz cessar, uma vez negado provimento ao recurso da defesa, a efICácia da decisão de primeiro grau, no ponto em que esta assegurou, ao sentenciado, o direito de recorrer em liberdade. Precedente."
(RTJ 168/526, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Impõe-se registrar, finalmente, que a alegada nulidade do julgamento, por suposta ocorrência de cerceamento de defesa, não parece revestir-se de plausibilidade jurídica, eis que - tal como enfatizado no parecer do Ministério Público Federal, transcrito nas informações prestadas pelo eminente Ministro HAMILTON CARVALHIDO (fls. 461/462) - as "231 folhas de documentos", produzidas, nos autos, por determinado co-réu, não teriam prejudicado o ora paciente ("pas de nullité sans grief'), quando do exame, pelos Juizes do TRF/3ª Região, do recurso de apelação criminal, não havendo tido, tais peças documentais, qualquer influência na resolução da causa, cujo desfecho. perante aquela E. Corte Regional, resultou parcialmente favorável ao ora paciente, que veio a ser absolvido das acusações pertinentes aos delitos tipificados nos arts. 6º e 10 da Lei nº 7.492/86 e no art. 288 do CP, com conseqüente repercussão na sanção penal imposta a Denizar Azevedo, que foi reduzida, de doze (12) anos de reclusão (fls. 457), para oito (8) anos
de prisão (fls. 458).
Sendo assim, e tendo presentes as razões expostas, não vejo como acolher a pretendida concessão de medida liminar requerida pelos ilustres impetrantes.
Publique-se.
Brasília, 1º de julho de 2002.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
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