INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

     OK
alterar meus dados         
ASSOCIE-SE

Artigos

Jur. ementada: CRIME PREVIDENCIÁRIO. LEI Nº 8.866/94. Criação do depositário infiel da Fazenda Pública. Ilícito civil. ""Abolitio Criminis"". Não configuração.

As opiniões expressas nos artigos publicados responsabilizam apenas seus autores e não representam, necessariamente, a opinião deste Instituto

TRF 3ª REGIÃO - APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1999.03.99.062466-8 (DJU 14.11.2000, SEÇÃO 2, p. 298) 

 

 

RELATOR: O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL THEOTONIO COSTA

 

APELANTE: JOSÉ RICARDO ROSALEN

 

APELADA: JUSTIÇA PÚBLICA

 

ADVOGADO: AGNALDO LUIS COSTA

  

 

EMENTA

  

 

PENAL. RETENÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS DESCONTADAS DOS SALÁRIOS DOS EMPREGADOS. ART. 95, "D" DA LEI Nº 8.212/91. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS COMPROVADAS. LEI Nº 8.866/94. CRIAÇÃO DO DEPOSITÁRIO INFIEL DA FAZENDA PÚBLICA. ILÍCITO CIVIL. "ABOLITIO CRIMINIS". NÃO CONFIGURAÇÃO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. ANISTIA. ART. 11 § ÚNICO DA LEI Nº. 9.639/98 INCONSTITUCIONALIDADE POR VÍCIO FORMAL RECONHECIDA. EFEITOS ERGA    OMNES. INEFICÁCIA. PRECEDENTES DO STF E DA TURMA. ART. 11, "CAPUT": APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. IMPOSSIBILIDADE. ANISTIA PARCIAL. SITUAÇÕES DÍSPARES. DOLO ESPECÍFICO. INEXIGÊNCIA. RESULTADO MATERIAL IRRELEVANTE. DELITO OMISSIVO PRÓPRIO. DIFICULDADES FINANCEIRAS. ESTADO DE NECESSIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. ARGUMENTOS METAJURÍDICOS. NÃO REPERCUSSÃO NA EXIGIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA PRINCIPAL E NA PUNIBILIDADE. EXIGIBILIDADE DE CONDUTA LÍCITA. PARCELAMENTO DA DÍVIDA. NÃO EFETIVAÇÃO. RESPONSABILIDADE PELO RECOLHIMENTO DOS VALORES AOS COFRES DO INSS. PRIORIDADE. EMPRESÁRIO. MERO RETENTOR. PREJUÍZO MONETÁRIO. ALEGAÇÃO DE VALOR INSIGNIFICANTE: IMPOSSIBILIDADE. DANO PECUNIÁRIO E SUPRESSÃO DE FONTE DE RENDA DE CUSTEIO PREVIDENCIÁRIO. CONDENAÇÃO MANTIDA. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. SUBSTITUIÇÃO. RESTRITIVA DE DIREITOS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

 

I - Comprovadas nos autos a autoria e materialidade delitivas do crime de falta de recolhimento das contribuições sociais descontadas dos salários dos empregados, cometido pela apelante, na qualidade de dirigente de empresa individual, responsável pelo cumprimento das obrigações legais desta, dentre elas o recolhimento das contribuições sociais devidas à Previdência.II - A Lei 8.866/94 traça normas de natureza civil e processual civil sobre a forma de cobrança de débitos para com a Fazenda Pública, criando a figura do depositário infiel de valores a esta pertencentes, com relação àqueles que possuem a obrigação de recolher tributos, por disposição legal. Porém, não suprimiu o delito inscrito na alínea  "d" do art. 95 da Lei 82112/91, pois não refere-se aos aspectos penais da falta de recolhimento de contribuições sociais. Tendo em vista a autonomia das instâncias, a responsabilidade penal independe de obrigação civil.   

 

III - lnviável a decretação da extinção da punibilidade, pela aplicação da anistia veiculada no parágrafo único do artigo 11 da Lei 9.639, na redação publicada no dia 26 de maio de 1998, por constituir-se em norma legal eivada de manifesto vício de inconstitucionalidade formal, mácula que impõe óbice intransponível à sua eficácia no ordenamento jurídico, decorrente da incompatibilidade vertical da norma com a Constituição Federal, em manifesta ofensa ao princípio da legalidade, retirando-lhe o fundamento de validade. Precedentes do STF e da Turma.                                

 

IV - Não há como invocar o principio da isonomia para situações dispares (artigo 95, "d" da Lei 8212/91 e "caput" do artigo 11 da lei 9639/98). A situação dos agentes políticas é peculiar e distinta daquela dos titulares de pessoas jurídicas privadas. A anistia parcial tratou desigualmente as pessoas desiguais, prestigiando o princípio da igualdade, e corrigindo situação de responsabilização sem culpa "lato sensu" de agentes políticos. 

 

V - O argumento de atipicidade da conduta pela ausência do dolo específico, ou seja, do empresário apropriar-se dos vaiares descontados dos salários dos empregados, sucumbe diante da análise da própria descrição típica do delito em apreço, que não veicula elementar relacionada à especial finalidade de agir do agente, bastando, para  sua configuração, o dolo genérica. Trata-se de crime omissivo próprio, que se consuma com a conduta negativa, indiferente o destino que se dê aos valores.                                                                                                                         

 

VI - Alegações de dificuldades financeiras da empresa, além de não comprovadas, não constituem-se em causa de exclusão da culpabilidade, que se consubstanciaria na inexigibilidade de conduta diversa, tratando-se de argumento metajurídico, que não repercute na exigibilidade da obrigação tributária principal que originou o débito fiscal incriminado. Patente nos autos que o apelante dispunha da alternativa do parcelamento do débito até o recebimento da denúncia, único meio que permitiria exigir-se-lhes conduta diversa da incriminada no tipo, e de acordo com o ordenamento jurídico. 

 

VII - Estado de necessidade não se confunde com estado de precisão, fazendo-se necessário a demonstração de que a violação a bem jurídico alheio é praticado como recurso extremo.                                                                                                                      

 

VIII - Cabe ao empresário tornar decisões que possibilitem o cumprimento de suas obrigações, dentre elas o recolhimento da parte dos salários dos empregados relativa à Previdência, eleita pelo legislador como prioritária, a ponto de definir o não recolhimento como crime, por ser mero retentor desses valores, não se configurando como hipótese de exclusão de ilicitude a insuficiência de recursos para atender, antes, todos os demais compromissos, inclusive com fornecedores ou empregados.  

 

IX - Nos delitos que atentam contra a seguridade social, descabe questionar a  expressão monetária do prejuízo suportado pelo Estado derivada da conduta delitiva,                            tachando-a de insignificante, visto que, acima do dano patrimonial, existe a supressão de fonte de custeio da Previdência Social, apropriada indevidamente pelo empresário, que lhe dá outra destinação, ilidindo ainda a confiança nele depositada pelo Estado e  pela sociedade, como retentor

transitório dos valores arrecadados dos empregados.                           

 

X - Condenação mantida.                                                                                        

 

XI - Substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, a saber, duas penas de prestação pecuniária, prevista no inciso I do artigo 43 do C.P., consistente no pagamento de 05 (cinco) cestas básicas oficiais por mês, pelo mesmo  tempo da condenação, a entidade pública ou privada com destinação social, nos termos do artigo 45, parágrafo 11 do C.P., a ser designada pelo Juíza das Execuções Penais, sem prejuízo da pena de multa estabelecida na sentença.                                             

 

XII -Apelo parcialmente provido.      

 

 

 

ACÓRDÃO 

                                                                                               

 

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas,             ACORDAM os Desembargadores Federais da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, em conformidade com a ata de julgamento, dar parcial provimento à apelação.

 

São Paulo,26 de setembrode2000 (data do julgamento).  

 



Seja o primeiro a comentar esta notícia, clique aqui e deixe seu comentário


  


IBCCRIM - Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - Rua Onze de Agosto, 52 - 2º Andar - Centro - São Paulo - SP - 01018-010 - (11) 3111-1040