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TRF
3ª REGIÃO - APELAÇÃO CRIMINAL
Nº 1999.03.99.077647-0/SP (DJU 14.11.2000, SEÇÃO 2, p. 299)
RELATOR
:
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL THEOTONIO COSTA
APELANTE
: LINCOLN SODRÉ
APELANTE
: EUNICE
PRADO DE OLIVEIRA
APELADO
: JUSTIÇA PÚBLICA
ADVOGADO:
SIDNEI LINFORCATO
PENAL. TRIBUTÁRIO. RETENÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS DESCONTADAS DOS SALÁRIOS DOS EMPREGADOS: ART. 95, "D" DA LEI Nº 8.212/91. PERÍCIA CONTÁBIL. DESNECESSIDADE. PRECLUSÃO. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS COMPROVADAS. DIFICULDADES FINANCEIRAS. ESTADO DE NECESSIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. ARGUMENTOS METAJURÍDICOS. NÃO REPERCUSSÃO NA EXIGIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA PRINCIPAL E NA PUNIBILIDADE. EXIGIBILIDADE DE CONDUTA LÍCITA. PARCELAMENTO DA DÍVIDA. NÃO EFETIVAÇÃO. DOLO ESPECÍFICO. INEXIGÊNCIA DELITO OMISSIVO PRÓPRIO. RESULTADO MATERIAL IRRELEVANTE. PAGAMENTO DO DÉBITO APÓS O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. NÃO APLICAÇÃO DA CAUSA EXTINTIVA DE PUNIBILIDADE (ART. 34 DA LEI 9.249/95). TIPICIDADE NÃO EXCLUÍDA. DOLO. IMPOSSIBILIDADE DE FRACIONAMENTO. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1533/96.
EXTINÇÃO DOS CRÉDITOS DO INSS. VALOR ÍNFIMO RECONHECIDO. REMIÇÃO FISCAL. ARTS. 156, IV E 172, III DO CTN. LESIVIDADE EXCLUÍDA. ANTIJURIDICIDADE DO DELITO DESCARACTERIZADA. LICITUDE CIVIL. INEXISTÊNCIA DE ILÍCITO PENAL. ABSOLVIÇÃO. APELOS PROVIDOS.
I
- Comprovadas nos autos a autoria e materialidade delitivas do crime de falta de
recolhimento das contribuições sociais descontadas dos salários dos
empregados, cometido pelos apelantes, na qualidade de dirigentes de empresa
individual, responsáveis pelo cumprimento das obrigações legais desta, dentre
elas o recolhimento das contribuições sociais devidas à Previdência.
II
- Alegações de dificuldades financeiras da empresa não constituem-se em causa
de exclusão da culpabilidade, que se consubstanciaria na inexigibilidade de
conduta diversa, tratando-se de argumento metajurídico, que não repercute na
exigibilidade da obrigação tributária principal que originou o débito fiscal
incriminado, exceto se demonstrada cabalmente.
III
- Estado de necessidade não se confunde com o estado de precisão, fazendo-se
necessário a demonstração de que a violação a bem jurídico alheio é
praticado como recurso extremo. Patente nos autos que os apelantes dispunham da
alternativa do parcelamento do débito até o recebimento da denúncia, único
meio que permitiria exigir-se-lhes conduta diversa da incriminada no tipo, e de
acordo com o ordenamento jurídico.
V
- O argumento de atipicidade da conduta pela ausência do dolo especifico, ou
seja, do empresário apropriar-se dos valores descontados dos salários dos
empregados, sucumbe diante da análise da própria descrição típica do delito
em apreço, que não veicula elementar relacionada à especial finalidade de
agir do agente, bastando, para sua configuração, o dolo genérico. Trata-se de
crime omissivo próprio, que se consuma com a conduta negativa.
VI
- O pagamento do débito previdenciário não permite a aplicação da causa
extintiva de punibilidade prevista no artigo 34 da lei 9.249/95, visto que foi
efetuado após o marco processual eleito, ou seja, o recebimento da denúncia.
VII-
Dolo e tipicidade do delito configurados, não excluídos pelo pagamento
posterior ao recebimento da denúncia, visto que a estrutura típica do delito
imputado apenas prevê conduta omissiva, operando-se o dolo no momento desta
conduta, e não por ato posterior e distinto.
VIII
- Afastada de plano a antijuridicidade da conduta dos apelantes, diante do valor
das contribuições sociais não recolhidas no período incriminado, pela edição
da medida provisória nº 1533-01, de 16 de janeiro de 1997, que veiculou a remição
fiscal, modalidade de extinção do crédito tributário, prevista nos artigos
156, IV e 172, III do Código Tributário Nacional.
IX
- Tornando-se a dívida dos apelantes para com a Previdência Social
insignificante para fins cíveis, considerada, portanto, revestida de licitude
civil, não pode, ao mesmo tempo, ser tida como ilícito penal, por força da
unicidade do direito.
X
- Sentença condenatória reformada, para absolver os apelantes, com fundamento
no artigo 386, III do CPP.
V
- Apelações providas.
Vistos,
relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas,
ACORDAM os Desembargadores Federais da Primeira Turma do Tribunal Regional
Federal da Terceira Região, em conformidade com a ata de julgamento, à
unanimidade dar provimento à apelação.
São
Paulo, 26 de setembro de 2000 (data do julgamento).
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